segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

REFLEXÃO

 


DISCURSO HIPÓCRITA

 

       Católicos e evangélicos são cristãos, dizem seguir a Cristo. Essa proposição é verdadeira ou falsa?

    A primeira parte (oração) é falsa: “Católicos e evangélicos são cristãos”.

          Por quê?

          Como será verificado a seguir, católicos e evangélicos acreditam ser cristãos, mas o negam com valores outros, com a obra realizada por eles.

      A segunda oração é verdadeira, porque católicos e evangélicos dizem seguir a Cristo, malgrado contradizê-lo na prática.

        Muitas passagens bíblicas constituem argumento de autoridade às considerações acima, como a expressa em Mateus 6:19-21:

 

Não queirais entesourar para vós tesouros na terra, onde a ferrugem e a traça os consomem, onde os ladrões os desenterram e roubam. Mas entesourai para vós tesouros no céu, onde não os consome a ferrugem, nem a traça, e onde os ladrões não os desenterram, nem roubam. Porque onde está o vosso tesouro, aí está também o vosso coração.

 

        Com a mesma clareza e entendimentos, lê-se em Mateus, 6:24: “Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou há de amar a este, e desprezar aquele. Não podeis servir a Deus e às riquezas”.

    Deus e riquezas são antípodas, portanto, inconciliáveis.

    Todavia, a passagem mais luminosa, coerente com as duas supracitadas, pode ser lida igualmente em Mateus, 22:15-21. Jesus responde aos fariseus que o inquiriam se era correto dar tributo a Cesar. Com uma moeda, que trazia a imagem e inscrição do imperador romano, Jesus não cai na armadilha e afirma com sabedoria: “Dai a Cesar o que é de Cesar, e a Deus o que é de Deus”.

        O que é que se dá a Cesar?

        O dinheiro.

      O dinheiro pode ser dado a Cesar, sem problema. Em contrapartida, a Deus se dá o bem imaterial, que transcende esta vida e conduz o cristão para a vida-além, o reino do outro mundo (como afirmou Jesus ante Pilatos).

        A desculpa de padres e pastores é de que eles mesmos, homens que se dizem cristãos, necessitam de dinheiro para viver nestes dias. A necessidade e o dinheiro já existiam nos tempos de João Batista e de Jesus de Nazaré. Por que não viver como eles, autênticos pregadores?

      O discurso hipócrita, que coaduna prosperidade material e preceitos cristãos, como o fez o bispo Edir Macedo, serve como prova do que Nietzsche constatou há um século e pico: “Deus está morto!”.

       Esse discurso só é possível em vista da lacuna aberta pela não inclusão de qualquer um dos versículos supracitados nas missas e cultos nestes dias.

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

ELEIÇÕES

 

I – PESQUISAS PRÉ-ELEITORAIS – O resultado das eleições deve ser confrontado com as pesquisas publicadas anteriormente. Caso a margem de erro for pequena, renda-se homenagem ao acerto, à seriedade dos institutos responsáveis, bom como aos órgãos de imprensa que divulgaram a pesquisa. Caso contrário, com disparidade considerável entre previsão e resultado, justifica-se uma campanha (pública ou privada) contra o caráter tendencioso do instituto que elaborou a pesquisa e do órgão midiático que fez a divulgação.

II – CAMPANHA ACUSATÓRIA – O eleitor brasileiro já é constituído moralmente pelo meme* “falcatrua”, facilmente identificado em seus representantes no governo, não mais se importa com as acusações pré-eleitorais de que esse ou aquele candidato cometeu algum crime no exercício de seu cargo anterior. Nenhum eleitor reconsidera o voto em vista de acusações feitas contra seu candidato. A imoralidade é banalizada.

III – TEMPO PERDIDO – Os críticos esclarecidos ainda não ousaram questionar a morosidade do processo eleitoral no Brasil. Ao tempo perdido com esse processo, soma-se a demora na fase posterior ao pleito, de formação e de adaptação do novo governo. O país para no mínimo por seis meses, uma vez que seus políticos de carreira se encontram em campanha, em suas bases eleitorais, ou se acomodando aos cargos a que foram eleitos.

* Meme: o termo foi cunhado por Richard Dawkins em 1976, no seu O gene egoísta, e vem da palavra grega “mimeme” (que significa “algo que é imitado”). O meme está para a cultura como o gene, para a biologia.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O DESAPARECIMENTO DE BÁRBARA

 


Muitas hipóteses buscam uma explicação para o desaparecimento de uma pessoa. Numa escala de 1 a 10, do menor ao maior grau de gravidade, a hipótese menos grave é de que o desaparecido está bem em algum lugar, a esconder-se dos seus; e a mais grave, ele foi sequestrado e morto. As hipóteses intermediárias são variações entre a vontade própria e a ação criminosa de terceiro(s). As determinantes dessa vontade seguem um grau de autonomia cada vez menor, da extravagância à depressão profunda.

O desaparecimento de Bárbara Machado Padilha de Tupanciretã, Rio Grande do Sul, com base no que já se sabe até agora, indica que foi um ato deliberado por ela. Sua motivação, todavia, permanece um mistério. Segundo os comentários do marido e de uma amiga, Bárbara era saudável, normal. Sim, até fazer o que fez. A decisão de fugir acusa uma anormalidade, que é agravada pelo fato de efetivá-la sem os documentos. Essa “loucura” parece se repetir no Posto Castelinho, em Santa Maria, quando Bárbara sai da loja de conveniência e segue a pé.

O fato de deixar em casa seus documentos é sintomático. Um dos casos mais famosos de desaparecimento, protagonizado por Carlos Sanches Ortiz de Salazar, fugido de Sevilha em 1996 e encontrado 20 anos depois a viver numa floresta próxima à Toscana, ainda conservava os documentos. De Salazar, com 26 anos na época, escondia a depressão de que era vítima (não obstante ser médico e psicólogo). No momento em que foi identificado, ele expressou o desejo de continuar recluso e desapareceu outra vez.

Bárbara fugiu sem documentos, cartões ou sacola de roupas, algo que sugere duas hipóteses: menos grave, saiu com a intenção de voltar logo; e, mais grave, sua intenção é desaparecer para sempre, com ou sem uma nova identidade. Ao prosseguir a pé sua fuga, num local bastante afastado do centro de Santa Maria, enfatizo, confirma uma forma de insensatez. Para que Bárbara compraria água e chocolate na conveniência? Para caminhar sem destino, como indica o último registro das câmeras, ou seguir viagem para outra cidade? A posse do celular endossa a intenção de um novo contato, pelo menos para sua acolhida em Santa Maria.

O celular não faz sentido na hipótese de Bárbara seguir o exemplo do médico espanhol, a se isolar na mata. Logo ficaria sem carga. Nesse caso, a polícia não poderia suspender as buscas tão somente porque é chegada a noite. Não há policial disponível? Patrulha de voluntários. A lei não permite? A lei está errada, não pode preceder à vida de uma pessoa. A propósito, Bárbara corre um perigo óbvio, factível: ser encontrada antes por homens maus. Dessa forma, a hipótese menos grave se aproxima da mais grave, a fechar uma escala circular.


segunda-feira, 12 de outubro de 2020

MONTANHA ACIMA

 

          Nietzsche criou duas metáforas para representar a trajetória do homem ao além-do-homem: a da corda estendida sobre um abismo e a da subida em direção ao alto, à montanha acima da cidade e de sua praça.

       Desde antes de ler Nietzsche pela primeira vez, concebi a busca da sabedoria como uma caminhada, exatamente como pensara o filósofo há mais de um século. Ele afirma (lembro duas vezes) que quanto mais você se eleva, menor se afigura aos que continuam embaixo, seja por estes são ludibriados por uma ilusão de ótica, seja por inveja.

         Uma vida é demasiado curta, a tomar como referência nossa cultura, para se chegar ao topo, mais próximo da luz que deve irradiar por lá. No entanto, desde já gozo de uma visão que se aclara  à medida que subo mais e mais. Nessa visão, incluem-se aqueles que sequer começaram a subida, por falta de coragem, tibieza, despeito ou presunção. Eles se encontram (ou se perdem) no rasteiro do sopé, incapazes de se desvencilharem do peso sobre seus ombros.

         Uma aporia me perturba ao longo da caminhada: ainda sinto compaixão pelos meus semelhantes (por um lado) e uma vontade inquebrantável de subir ainda mais (por outro). Aquele sentimento me puxa para baixo, ao contrário da força ativa, que me torna mais livre e mais seguro. Todos devem se conduzir pelas próprias pernas, fazer seu próprio caminho – algo que depende de um querer determinado.

         Na altura em que me encontro, o vento é fresco e o estar-só uma condição muito agradável. Tudo abaixo se apequena, visto pela compreensão ampliada continuamente. Tudo acima ganha em claridade. A julgar pelo bem que experimento desde agora, o alto é o meio do caminho, é descer outra vez, qual o personagem liberto da caverna na alegoria de Platão.

         Em meio à luta dos homens lá embaixo, correrei o risco de ser incompreendido como o foi Zaratustra, tomado como um excêntrico, um herege, uma ameaça aos valores tradicionais, às "verdades" instauradas pelo hábito. Já convivi com eles nas primeiras duas décadas da minha vida. Ainda jovem, portanto, iniciei esta caminhada. 

sábado, 3 de outubro de 2020

SER-AÍ (CRÔNICA DE CURITIBA)

    Hoje caminhei pelo centro de Curitiba. Esse passeio se tornara uma rotina antes de ir para o Rio Grande do Sul em março. Minha residência anterior distava uma quadra da Boca Maldita, o coração da capital, lugar em que encontro alguns conhecidos.

     A loja das Livrarias Curitiba me acolhe como cliente especial. O Luiz se encontrava no calçadão, a expor seus quadros de ipês carregados de amarelo. O Plá e a Flor, sua companheira, talvez viessem mais tarde, para vender suas frases filosóficas.

     Sentado num banco, entre os canteiros de flores, reencontrei um amigo do peito, poeta que vivifica as palavras com a própria existência. Ele me contou uma história muito triste sobre seu filho viciado, que o incomoda há dez anos. Estava sem celular pela décima vez, afanados pelo adotivo para pagar as dívidas da droga. Malgrado dois infartos, ele desabafou que renasceria com a morte do rapaz, um destino de médio prazo.

     Um tanto impressionado com seu desabafo, deixei-o ali sob a manhã fechada de sábado. O homem é boníssimo, mas sofre as consequências de escolhas pretéritas. Menos mal que essa dor que o atormenta possa se constituir num leitmotiv para sua poesia, metaforizado em doçura.

     O movimento na XV era intenso naquela hora da manhã. Milhares de pessoas num ir e vir sem fim, pleno de liberdade. Cada uma delas, todavia, personagem real de um drama maior ou menor, de um drama inimaginável.

    Retorno pensativo para casa no Bacacheri, onde resolvo escrever esta crônica. Assim penso demonstrar textualmente minha empatia, meu ser-aí (no sentido hegeliano) propenso à intersubjetividade.


terça-feira, 15 de setembro de 2020

GRANDE CONSTITUIÇÃO TURCA

Como a Turquia ainda consegue ser um Estado laico, se quase a totalidade da população é islâmica?

Essa questão desafiadora ocorreu-me ontem, quando assistia ao filme Mucize (O milagre)*. O professor Mahir voluntariou-se para dar aulas num vilarejo distante entre as montanhas do oeste turco. Ao chegar lá, depois de uma longa caminhada, Mahir constata que não há escola desde sempre. Seus moradores são analfabetos e vivem segundo um sistema moral fundamentado na tradição. Antes de tomar o trem de volta, Mahir decide ficar e construir a escola, com apenas uma condição: a inclusão das meninas. As instalações foram erguidas rapidamente com a ajuda de “bandoleiros”, gente do lugar que vive à revelia da lei.

            Sem o conhecimento necessário, sou instado a pensar de acordo com o estereótipo de que os países islâmicos do Oriente são governados teocrática e ditatorialmente, cujos exemplos mais conhecidos são o Afeganistão, a Arábia Saudita e o Irã. A Turquia, todavia, representa uma bela exceção. Esse país é democrático, ordenado juridicamente por uma das melhores constituições do mundo (reeditada em 1982).

            Num tempo em que os regimes democráticos do Ocidente se permitem laivos conservadores, de fundamentalismo religioso, de recaída fascista, de inclinação de direita ou de esquerda, a Turquia continua o Estado democrático, secular. Embora o presidente Recep Tayyip Erdogan tenha apoiado o domínio muçulmano, com a conversão de igreja ortodoxa cristã em mesquita, a constituição turca transcenderá a esse político. Obviamente, o país sofre outras ameaças políticas, como a organização marxista dos curdos e a tensão com a Grécia.

             A laicidade da Turquia, ouso dizer, representa uma das maiores barreiras intercontinentais para o avanço islâmico em direção ao Ocidente.

                   

* Filme turco lançado em 2015, dirigido por Mahsun Kirmizigul. 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

ANA SAUDADE (conto)

        A trilha molhada até a várzea não firma os tamanquinhos já gastos de Nenê e Menina. Ana os segue de perto, a pedir que os pequenos tomem cuidado para não cair no barro. Mais abaixo, os três pegam uma estrada melhor entre o morro e o Rosário.

        A caminhada não termina na Sédia, onde moram famílias com mais haveres. Nenê sonha de olhos abertos, azuis como a nesga de céu que se mostra por trás das nuvens:

        – Mãe, por que a gente não se muda pra cá?

      Ana sorri com a pergunta, balança a cabeça negativamente. A menina adivinha seu desejo inconfessável? Outra coisa a preocupa nesta tarde, como tantas tardes dos últimos dois anos. Otávio prometeu-lhe escrever do Rio de Janeiro. Uma carta veio há dois Natais. A saudade continua a crescer no peito como um espinheiro.

       Nenê e Menina diminuem o passo, admirados com o movimento da vila.

         Andem! Andem! Não querem ver o trem? Na volta, vamos à igreja.

           Ainda falta meia hora para chegarem à estação do Curussu.

           Sobre a ponte, Menina joga uma pedra no rio. Inutilmente, o guri vira a cabeça para ouvir o choque da pedra com a água. A ponte é alta demais. Com os tamancos na mão, corre para alcançar a mãe e a irmã.

           Uma subida longa do outro lado do rio exige força na perna. A conversa cansa mais agora, mas assim que eles chegam ao plano, Menina indaga a mãe:

           – O trem vem daonde?

           – Já te disse dez vezes, Menina. O trem vem de Porto Alegre e vai para São Borja.

           – Um dia quero ir pra São Borja.

           – Eu quero pra Porto Alegre – Nenê o contraria.

           – O trem não demora, depressa!

           A ponte da ferrovia, segmentos da linha férrea e a estação de Curussu são vistas do morro. O coração parece sair pela boca dos meninos. A paisagem é muito diferente da serra onde moram, rodeada de canavial e mataria.

           Um apito é ouvido. A locomotiva faz sua aparição, como se flutuasse no meio da fumaça produzida por ela. O ritmo das explosões e do bater metálico das bielas diminui a frequência. A parada está próxima. Ana e os filhos chegam finalmente.

           Alguns passageiros descem, outros sobem para dentro dos vagões. A viagem termina, inicia-se ou continua (para aqueles que permaneceram no trem). Ana, Nenê e Menina assistem estupefatos ao movimento da estação.

           O ritmo das explosões e do bater das bielas aceleram. A locomotiva expele fumaça para todos os lados. As rodas começam a girar num chiado ensurdecedor. O trem parte boqueirão afora. Curussu volta a fazer silêncio.

           Ninguém ouve o coração de Ana, quando se dirige ao responsável pela estação. Ela veio muitas vezes à espera da carta de Otávio, o filho que foi embora e não dá notícia há dois anos. O ferroviário procura entre os envelopes que tem nas mãos.

           – Nada, dona Ana!


quarta-feira, 26 de agosto de 2020

O FIM DA HUMANIDADE

 


Ao cabo de uma jornada de trinta anos de viagem espacial, alienígenas chegam à Terra, o planeta com vida no sistema solar. Para a sorte dos visitantes, encontram apenas vestígios recentes da espécie humana. Certamente, os homens se oporiam a uma civilização mais inteligente, cujo objetivo da viagem é de colonizar o planeta.

         Caso ainda sobrevivessem, os homens se surpreenderiam três vezes com essa “invasão”: os alienígenas são criaturas bastante distintas das imagens criadas na Terra para representá-los fisicamente; eles já alcançaram o nível 2 da Escala de Kardashev*, mais inteligentes; e não são agressivos, malgrado o objetivo colonizador. Tais características impactariam contra o preconceito antropocêntrico.

          Depois de uma exploração rápida nos lugares demarcados pelas ruínas, os alienígenas concluem as causas da extinção humana: pandemias sucessivas e uma guerra nuclear. As máscaras formam montanhas nos lixões (não eliminados pelo fogo) e cobrem a superfície de lagos, mares e oceanos. A radioatividade ainda está presente no ar e nas coisas sólidas. Os exploradores deduzem a partir de todos os sinais preservados, que a pandemia causou a guerra, e as duas somadas precipitaram o fim da humanidade.

         Décadas antes do presente, em que os alienígenas chegam à Terra, um pensador humilde imaginou os atores deste cenário escatológico: a China desenvolveria um micro-organismo dez vezes mais letal que o Coronavírus; os Estados Unidos, com as provas dessa criação, atacariam os laboratórios chineses. A guerra entre as duas superpotências seria deflagrada instantânea e devastadoramente, o que significa dizer a morte de bilhões de pessoas. Outros bilhões morreriam antes, atingidos pela pandemia. Os bilhões restantes sofreriam o ataque de ambos os males.

         Quando esse catastrofista escreveu sobre o futuro, alguns dos leitores o ignoraram simplesmente. Toda distopia repugna os espíritos otimistas, não importa se ela vem seguida de uma utopia: a da chegada dos alienígenas para povoar a Terra com uma nova civilização.

* Nicolai Kardashev, astrofísico russo, calculou (em 1964) que as civilizações se dividem em três tipos, segundo a quantidade total de energia à disposição.

            Tipo I – civilização capaz de aproveitar a energia total de seu planeta;           

            Tipo II – civilização capaz de aproveitar o total de energia de uma estrela;

            Tipo III – civilização capaz de aproveitar a energia de uma galáxia inteira.

            A civilização humana estaria próxima de 0,7.

            Outros tipos foram acrescentados à Escala de Kardashev.


sexta-feira, 31 de julho de 2020

OS VIZINHOS: UMA ALEGORIA DE MIA COUTO


        O conto Os vizinhos, de Mia Couto, tem um enredo interessante, a servir de alegoria na descrição de um problema que se agrava em nossa sociedade, em (des)razão do individualismo radical e da dualidade ideológica (insuflada pela chamadas fake News).
         Na impossibilidade de transcrever o conto todo, publicado no livro Na berma de nenhuma estrada, cito o primeiro parágrafo:

As famílias se davam, cordiais, uma e sabugo. Não havia dia que não trocassem favores, emprestassem alegrias, esmiudaçassem conversa. Aquilo era como se não houvesse paredes. Ou que não tivessem ouvidos: digamos que uma família única distribuída em duas casas (p. 151)

        As duas famílias partilhavam do mesmo cão de guarda. Os filhos se namoriscavam, a trocarem bilhete no começo e travesseiro mais adiante.
         Tudo ia muito bem, “até que começaram as notícias”. A televisão insistia em conflitos étnicos, coisa que as famílias não sabiam muito bem. Todavia, “as notícias se adensaram como as nuvens de novembro”. Todos já sabiam o que significava étnico. Não bastassem os aspectos rácicos, com variantes religiosas, as notícias falavam em conflito.
         O noticiário acabava em discussão, o que justificou a não mais verem em comum a televisão.
         Um dia, o vizinho da esquerda bateu à porta do outro, a perguntar-lhe: “Desculpe, vizinho, mas você tem raça?”. O outro respondeu que sim. Não lhe disse que se tratava da outra raça, verdadeiramente pura, para evitar mal-entendido. Mesmo assim, complementou que em sua casa já comentavam sobre a etnia do outro.
        O terceiro passo foi o de as portas se fecharem uma para outra (como metáfora dos próprios corações).
         O narrador comenta que “ninguém lhes deu essa ordem de separação”. O noticiário os condicionava a ela. Os dois lados se perguntavam como foram amigos anteriormente. A religião de cada família era diferente.

A distância foi dando lugar ao ódio. E à convicção de que a culpa dos males mundiais residia ali ao lado. Desgraças passadas e futuras só tinham uma única e fácil explicação: os outros, ali à mão de serem condenados (p. 153)

         Até que um dos vizinhos resolveu matar o seu próximo. No escuro, com a arma na mão, prestes a atacar o outro, sofreu o ataque do cão. O vizinho que seria atacado se virou e, não reconhecendo a ação agressiva, achou interessante retomar uma conversa com o outro. Os dois gostaram do reencontro e combinaram alternar os passeios com o cão nas noites próximas.

quarta-feira, 29 de julho de 2020

MADRUGADA

Os galos já cantaram trinta vezes nesta madrugada. Eles cantam do alto de suas árvores, onde se protegem de predadores que subsistem na memória filogenética da espécie.
Nada me foi negado, exceto o sono. Pelo contrário, meu coração está a exigir um novo sim, uma nova afirmação da vida.
A ouvir o canto dos galos (ante a perspectiva do dia), penso que o melhor caminho é a estrada, onde amealho horizontes.

AS PESSOAS...


Caro leitor, você lê acima um tipo de enunciado que repercute muito nas redes sociais. Todavia, seu significado denuncia duas falácias e uma presunção. 
As falácias são de generalização: "quase ninguém é amigo de ninguém" e "as pessoas". A presunção: o sujeito enunciador é o único certo, ao se colocar aquém das pessoas que o  "tratam conforme o interesse delas". 
O pressuposto é que ele trata as demais pessoas da outra forma, conforme o interesse delas e não conforme seu próprio interesse.
O fato de existir amizade no mundo real não é uma exceção. como é expresso pelo modalizador discursivo "quase". É inegável que existe amizades e amizades.
Uma psicologia mais profunda verá por trás do discurso desse sujeito, o desejo individualista de terra arrasada, de catastrofismo intersubjetivo.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

NIETZSCHE DISTORCIDO



       No livro Nietzsche para estressados, Allan Percy seleciona 99 sentenças do filósofo alemão e as transforma em autoajuda.
         Sem uma razão deliberada, rompi o plástico que protegia o volume (há alguns anos intacto) e o abri aleatoriamente para conhecer seu conteúdo. O primeiro excerto que leio no alto da página 24 é

As pessoas nos castigam por
nossas virtudes. Só perdoam
sinceramente nossos erros

         Não casualmente, um dos livros que releio nestes dias é Assim falou Zaratustra, em que a beleza e a sabedoria se encontram unificadas num texto sem comparação na história da filosofia. No discurso de Zaratustra, Das moscas do mercado, o sábio sugere a alguém com “ouvidos delicados” que se afaste do mercado, onde há o “barulho dos grandes atores e o zumbido das moscas venenosas”.
         A título de esclarecimento, os “ouvidos delicados” pertencem a alguém capaz de ouvir Zaratustra sobre a verdade de que o homem é algo a ser superado. Alguém propenso a ser um espírito livre. Os “grandes atores” são aqueles que falam para o povo, sacerdotes, pastores, políticos, filósofos, jornalistas... As “moscas” são os homens de rebanho, intolerantes à grandeza, ressentidos...
Salvo pequenas variantes de tradução (sem alterar o conteúdo), o excerto correto é

Eles te castigam por todas
as virtudes. Perdoam-te
sinceramente apenas – os erros

A distorção feita pelo autor de Nietzsche para estressados é considerável, a tomar em consideração as pessoas envolvidas no discurso. Há a substituição de “eles” (homens de rebanho) por “as pessoas”. Quem são essas pessoas? Mais grave ainda é a troca de alguém possuidor de uma qualidade que o distingue do povo (para quem se dirige Zaratustra), por “nós”. Quem são esses tomados pelo pronome nós (diferentes das pessoas que castigam)?
Esse “nós” do autor também comporta as pessoas acusadas de não tolerarem a virtude nos outros. Zaratustra diria que todas as pessoas envolvidas no excerto distorcido por Percy são eles, homens de rebanho, moscas do mercado. O próprio autor, que é coach, constituir-se-ia num barulhento grande ator, a representar para os leitores.

quinta-feira, 23 de julho de 2020

TARDÍGRADO NO SOL?



            O Canal TILT do UOL, a versar sobre tecnologia, não é sério com a publicação da matéria: “Mancha achada no meio do Sol poderia ou não ser um tardígrado?”.
         A astronomia é uma ciência que evolui atrás de hipóteses cada vez mais difíceis de serem comprovadas (principalmente ao tratar de outras galáxias). No caso acima descrito, a pergunta beira o ridículo.
         Em primeiro lugar, não é no “meio do Sol”, a significar um determinado ponto de sua superfície. Não se diz de qualquer objeto na Terra, visto do espaço, que ele está no meio da Terra. Em segundo, mesmo que você (leitor) seja leigo no assunto, começa a leitura (pelo título mal formulado), a esperar uma análise da ESA (Agência Espacial Europeia) ou da NASA, não de internautas bobalhões.
         Após as imagens divulgadas do Sol por essas agências, a mais importante observação desses “especialistas” de plantão foi comparar uma das manchas solares com um tardígrado, e se esse micro-organismo (0,5mm de comprimento) poderia sobreviver no Sol.
         Uma das características conhecidas do tardígrado é sua adaptação à alta temperatura, certamente não superior à da água fervente. A ebulição desse líquido ocorre a 100ºC ao nível do mar, todavia a temperatura da fotosfera solar é de aproximadamente 6.000ºC. Um pouco mais da metade dessa temperatura é suficiente para fundir os metais mais resistentes.
         Essa matéria do UOL é só mais um exemplo do que é publicado amiúde nos sites com maior acesso no mundo virtual. A sanha sensacionalista (para vender) não tem limite, a atender a demanda sem limite da ignorância.
        

quarta-feira, 15 de julho de 2020

sexta-feira, 10 de julho de 2020

JÚLIA E O MONSTRO


        Os contos de fada narravam a violência entre bichos e humanos, entre humanos e seres imaginários. Entre o mau e o bom, entre o bem e o mal. Por uma injunção moral, fazia-se justiça, e a história tinha um final feliz.
        Noutras palavras, tem razão o personagem do romance O gênio e a deusa, de Aldous Huxley:
        – O mal da ficção – disse John Rivers – é que ela faz sentido demais. A realidade nunca faz sentido.
        A realidade não faz sentido, prossigo por minha conta, em vista de sua injustiça contra a vida.
        Júlia Rosenberg era uma jovem linda, inocente, estudante de veterinária (profissão que requer atenção especial aos bichos não humanos), que caminhava numa trilha entre as praias Paúba e Maresia, no litoral de São Paulo.
         Todavia, à espreita de Júlia, havia um homem com aparência normal. Não era um animal, não era uma criatura teratológica, não era um demônio, mas apenas um homem.
Um homem apenas, que a ficção jamais soube descrevê-lo em sua crueldade. Um monstro, que nem a barbárie foi capaz de produzir, mas uma civilização à beira da loucura.

terça-feira, 7 de julho de 2020

ZECHARIA SITCHIN: O DISPARATADO 12º PLANETA


       No primeiro parágrafo de o 12º Planeta, de Zecharia Sitchin, lê-se:

De todas as provas que acumulamos para apoiar nossas conclusões, a primeira a ser exibida é o próprio homem. De vários modos, o homem moderno, o Homo sapiens, é um estranho à Terra (p. 15).

       Primeiramente, o autor começa a defender suas conclusões (que o leitor não sabe quais são), a citar aquela que seria a prova fundamental: o homem contemporâneo é um estranho à Terra.
       No Prólogo, ele afirmara que os Nefilim, habitantes de um planeta invasor ao Sistema Solar, “criaram o homem na Terra”.
       O parágrafo acima, todavia, servir-me-á para destacar a prova do primeiro disparate (segundo Houaiss (2009), “dito ou ação ilógica, absurda, ou fora da realidade, contrassenso, despautério”).
        Primeiro disparate: o homem contemporâneo é um estranho à Terra. Por que é um disparate? A evolução da vida no planeta é um fato, uma verdade comprovada pela ciência. Por volta de sete milhões de anos, uma pequena variação genética dividiu uma espécie ancestral em duas: chimpanzé e homem. Não o homem como o conhecemos no presente, senão uma criatura do mesmo gênero.
       A genética entre chimpanzé e homem é semelhante em 99%, o que causa um problema sério à tese de Sitchin. Por que o homem teria vindo de outro planeta, e o chimpanzé não? Na hipótese da variação genética entre os dois ser administrada pelos Nefilim, por que as variações entre as outras espécies ocorreriam por fatores aleatórios?
       A referência do chimpanzé leva em conta a maior proximidade, mas a semelhança continua em grau cada vez menor dentro da ordem dos primatas. Na sequência, também os gorilas, os orangotangos, os gibões, os macacos do velho mundo, ab origine.
       No terceiro parágrafo, Sitchin pergunta

Se tudo começou através de uma série de reações químicas espontâneas, por que é que a vida na Terra tem uma única fonte e não uma multitude de fontes causais? E por que é que toda a matéria viva na Terra contém tão poucos dos elementos químicos que abundam na Terra e tantos daqueles que são raros em nosso planeta?

       Quem se encanta a priori com a hipótese estapafúrdia de Sitchin e ignora completamente a evolução biológica não se dará conta desse segundo disparate.
       O dizer que a vida na Terra tem “uma única fonte” causal é falacioso, na medida em que há uma multitude de fontes. O argumento de que a matéria viva contém tão poucos elementos químicos que abundam na Terra é uma inverdade, impossível de ser minimizada como falácia.
       O corpo humano, por exemplo, compõe-se quase inteiramente dos elementos que mais abundam no planeta: Oxigênio, Carbono, Hidrogênio e Nitrogênio. Em menor proporção, incluem-se Sódio, Fósforo, Cálcio, entre outros. Quais os elementos raros?  
       Ao virar a página, lê-se

Depois, súbita e inexplicavelmente, há 35.000 anos, uma nova raça de homens – Homo sapiens (“o homem pensante”) – apareceu como que vinda do nada e varreu o Homem de Neanderthal da face da Terra.

       O terceiro disparate é a expressão “súbita e inexplicavelmente”, somada à datação de 35.000 anos antes do presente. Não somo aqui o desaparecimento do neanderthal, ainda não provado inteiramente.
       Aparição súbita do homo sapiens? Segundo DIAMOND (2010), a última espécie do gênero homo surgiu há 500 mil anos na África, de onde saiu entre 100 e 70 mil anos, para dominar o planeta. Inexplicavelmente? O Homo sapiens vindo do nada? Eles avançavam há mais de 30 mil anos, desde que, saindo da mãe-África, tomaram os continentes a leste, norte e oeste. O encontro com o neanderthal era previsto, explicável. O longo caminho da África à Europa não pode ser simplificado como nada.
       No capítulo 12, todavia, Sitchin escreve:

O homem é o produto da evolução; mas o homem moderno, Homo sapiens, é o produto dos “deuses”, uma vez que, em algum lugar há cerca de 300.000 anos, os Nefilim tomaram um homem-macaco (Homo erectus) e implantaram nele sua própria imagem e semelhança (p. 312).

       O Homo sapiens é resultado de uma mutação provocada pelos Nefilim. Sem dúvida, esse é o maior disparate do livro todo. O homem é produto da evolução, mas o homo sapiens não. Se os Nefilim criaram a espécie há 300 mil anos, malgrado terem aterrissado há 450 mil, por que o homo sapiens viria do nada há 35 mil anos (conforme citação acima)? Afinal, Sitchin vê ou não vê diferença entre o homo sapiens e o homem moderno?
       Quem são os Nefilim? De que planeta eles são naturais? Os alienígenas seriam criaturas muitíssimo inteligentes, oriundos do planeta Marduk, que teria uma órbita absurdamente excêntrica, completada em torno do Sol a cada 3600 anos. Esse planeta, diga-se de passagem, nunca foi observado pelos potentes telescópicos (capazes de detectar estruturas celestes a 12 bilhões de anos-luz).  
       Os disparates são às centenas, a exigir um trabalho extenso para destacá-los criticamente. Mesmo assim, Sitchin conta com adeptos espalhados pelo mundo todo (tão convencidos quantos os terraplanistas).

REFERÊNCIAS
DIAMOND, Jared. O terceiro chimpanzé; tradução Maria Cristina Torquilho Cavalcanti. – Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 46.

HOUAISS. Dicionário da Língua Portuguesa.
SITCHIN, Zecharia. O 12º Planeta; tradução de Ana Paula Cunha. São Paulo: Editora Best Seller, 1978.

terça-feira, 30 de junho de 2020

UFOLOGIA: UMA RELIGIÃO CONTRA AS RELIGIÕES


       Toda imagem no céu (geralmente de luzes) é logo classificada como Objeto Voador Não Identificado. Ato contínuo, as fake News se disseminam na velocidade da luz. A “crença” em OVNIs conta com uma legião de seguidores, mais numerosa que as estrelas visíveis à noite.
        Os ufólogos sustentam a não identificação do objeto visto como discurso que protege sua “religião” de evidências indesejáveis. O verdadeiro objeto da crença ufológica é a vinda de seres alienígenas.
        Ao invés de contradizê-los, todavia, imagino que eles estejam certos com a seguinte argumentação: para realizar a viagem até a Terra, a tripular uma nave espacial, o visitante é muito mais inteligente que o homem (ainda com dificuldade para chegar a Marte). Essa maior inteligência constitui o primeiro impacto nos preconceitos e nas vaidades homocêntricos.
        A imaginação (por mais fértil) não é suficiente para elencar os efeitos reais sobre os humanos. Um dos maiores construtos imateriais da humanidade, os deuses seriam volatizados por atacado com a comprovação de vida extraterrestre.
        Infelizmente, os alienígenas não aparecem, para resolver de vez o Paradoxo de Fermi* – como creem já resolvido os ufólogos.
        
* Paradoxo de Fermi é a aparente contradição entre as altas estimativas de probabilidade de existência de civilizações extraterrestres e a falta de evidências para, ou contato com, tais civilizações. (WIKIPÉDIA)

terça-feira, 23 de junho de 2020

UMA MUDANÇA POSSÍVEL


A pandemia determina algumas mudanças em nossos hábitos, o que não ocorria há muito (desde que passamos a tomar esses hábitos como a expressão inconteste de nossa autonomia).
       Entre os hábitos impostos pela necessidade de isolamento, o de ficar em casa é o de menor aceitabilidade, a gerar certo incômodo físico e psicológico. Esse mal-estar não se deve ao tempo ampliado de convivência familiar, senão ao espaço limitado de ir e vir.
       Para alguns, a falta de contato interpessoal cede vez a um voltar-se a si mesmo, a uma introspecção. Nesse aspecto, sustenta-se o argumento de que o mundo pós-pandemia será outro, mais intersubjetivo, mais relacional.
       O autoconhecimento é condição para o conhecimento do outro. Conhecer a si mesmo transcende o pré-conceito que está na base de todo julgamento apressado, de toda culpa (ou de toda inocência) autoatribuída. Essa introspecção pode voltar-se para fora, para a relação com o outro, então não mais enquadrado em estereótipos pré-concebidos.
       Caso essa evolução aconteça, certamente o mundo pós-pandemia será melhor, a partir de novos hábitos menos individualistas. 

quarta-feira, 17 de junho de 2020

LITERATURA E SABER


         A mais clara influência roseana em Mia Couto é o provérbio curto e seco. Na linha de “viver é muito perigoso” de Grande sertão: veredas, destaco alguns exemplos abaixo:
         “Melhor sentinela é não ter portas”;
         “A fome quando ferra nos faz fera”;
         “A dor é uma janela por onde a morte nos espreita”;
“A felicidade só cabe no vazio da mão fechada”;
“O homem é como a casa: deve ser visto por dentro”;
“A riqueza é como o sal: só serve para temperar”;
“Em terra de cego quem tem um olho fica sem ele”;
“As paredes têm mais orelhas que o elefante”;
“As raças são fardas que vestimos”;
“São as esperas que fazem envelhecer”;
“Os mortos não morrem quando deixam de viver, mas quando os votamos ao esquecimento”;
“Quem quer vestir-se de lobo fica sem a pele”;
“A guerra fere mesmo os que nunca saíram em batalha”;
“Quem quer a eternidade olha o céu, que quer o momento olha as nuvens”;
“A mulher não transporta água; ela traz os rios todos dentro”;
“O demônio mora sempre entre os vizinhos”;
“O boi sem cauda pode passar pelo capim em chamas”;
“Feridas da boca se curam com a própria saliva”;
“O silêncio é a língua de Deus”;
No charco onde a noite se espelha, o sapo acredita voar entre as estrelas”.

         Esses provérbios foram transcritos de Terra sonâmbula, Antes de nascer o mundo e Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, do romancista moçambicano.
         A propósito, para uma edição de João Guimarães Rosa no país africano, uma das falas mais conhecidas de Riobaldo sairia desta forma: “Diadorim é meu cacimbo”.