quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O DESAPARECIMENTO DE BÁRBARA

 


Muitas hipóteses buscam uma explicação para o desaparecimento de uma pessoa. Numa escala de 1 a 10, do menor ao maior grau de gravidade, a hipótese menos grave é de que o desaparecido está bem em algum lugar, a esconder-se dos seus; e a mais grave, ele foi sequestrado e morto. As hipóteses intermediárias são variações entre a vontade própria e a ação criminosa de terceiro(s). As determinantes dessa vontade seguem um grau de autonomia cada vez menor, da extravagância à depressão profunda.

O desaparecimento de Bárbara Machado Padilha de Tupanciretã, Rio Grande do Sul, com base no que já se sabe até agora, indica que foi um ato deliberado por ela. Sua motivação, todavia, permanece um mistério. Segundo os comentários do marido e de uma amiga, Bárbara era saudável, normal. Sim, até fazer o que fez. A decisão de fugir acusa uma anormalidade, que é agravada pelo fato de efetivá-la sem os documentos. Essa “loucura” parece se repetir no Posto Castelinho, em Santa Maria, quando Bárbara sai da loja de conveniência e segue a pé.

O fato de deixar em casa seus documentos é sintomático. Um dos casos mais famosos de desaparecimento, protagonizado por Carlos Sanches Ortiz de Salazar, fugido de Sevilha em 1996 e encontrado 20 anos depois a viver numa floresta próxima à Toscana, ainda conservava os documentos. De Salazar, com 26 anos na época, escondia a depressão de que era vítima (não obstante ser médico e psicólogo). No momento em que foi identificado, ele expressou o desejo de continuar recluso e desapareceu outra vez.

Bárbara fugiu sem documentos, cartões ou sacola de roupas, algo que sugere duas hipóteses: menos grave, saiu com a intenção de voltar logo; e, mais grave, sua intenção é desaparecer para sempre, com ou sem uma nova identidade. Ao prosseguir a pé sua fuga, num local bastante afastado do centro de Santa Maria, enfatizo, confirma uma forma de insensatez. Para que Bárbara compraria água e chocolate na conveniência? Para caminhar sem destino, como indica o último registro das câmeras, ou seguir viagem para outra cidade? A posse do celular endossa a intenção de um novo contato, pelo menos para sua acolhida em Santa Maria.

O celular não faz sentido na hipótese de Bárbara seguir o exemplo do médico espanhol, a se isolar na mata. Logo ficaria sem carga. Nesse caso, a polícia não poderia suspender as buscas tão somente porque é chegada a noite. Não há policial disponível? Patrulha de voluntários. A lei não permite? A lei está errada, não pode preceder à vida de uma pessoa. A propósito, Bárbara corre um perigo óbvio, factível: ser encontrada antes por homens maus. Dessa forma, a hipótese menos grave se aproxima da mais grave, a fechar uma escala circular.


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