quinta-feira, 27 de novembro de 2008

POEMA & POESIA

A Secretaria de Cultura de uma cidade vizinha de Santiago criou um concurso literário em três modalidades: redação, poema e poesia.
Há poucos dias, postei sobre o universo lexical que caracteriza cada usuário de uma língua. O número de palavras que compõem esse universo se amplia constantemente, num ritmo que depende das leituras e consultas metalingüísticas. O dicionário é indispensável.
Como se destinava a alunos da rede de ensino, penso que o concurso foi idealizado por professores que trabalham com a produção de texto. Apenas por isso, as modalidades acima me chamaram atenção.
O senso comum (incluindo suas crisálidas mais desenvolvidas literariamente) sempre confundiu “poema” e “poesia” como sinônimos. Com muita freqüência, li e ouvi indistintamente a frase “escrevi um poema”, “escrevi uma poesia”.
Pela primeira vez, encontro uma distinção categórica entre os dois vocábulos, definindo gêneros textuais característicos. Até o século passado, alguns dos nossos filólogos ainda definiam “poema” como uma composição poética de certa extensão e “poesia” como uma composição poética de pouca extensão. Reflexos de um paradigma cartesiano.
Ainda bem que a língua possui dinamicidade, muda com o tempo. O uso é um dos principais critérios de mudança. Basta ler o histórico do nosso Português, cuja origem remonta ao latim vulgar.
Modernamente, poema é um gênero textual, escrito em versos, independentemente da extensão. O Poema do beco, de Manoel Bandeira, não passa de um dístico (dois versos):
oo
Poema do Becooo
Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?
— O que eu vejo é o beco.oo
Poesia é uma soma de vários elementos fônicos, morfológicos, sintáticos e semânticos que distinguem o texto literário, dotando-o de literariedade (seja um poema, uma crônica etc.). O poema é corpo que dança com o ritmo. A poesia é alma que encanta com a beleza das metáforas.
Redação também não é gênero, mas a ação de escrever, de produzir textualmente.

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