Toda vez que ouço a
palavra sustentabilidade, fico a pensar no abismo que se interpõe entre fala e
conduta, entre ideal e realidade. O que me assombra nesse abismo não é sua
profundeza, mas suas margens fugidias (em planos distintos), inapropriadas para
a sustentação de uma ponte.
Tal
impossibilidade aumenta caso a fala denuncie o (pre)conceito manjado de que o
uso dos recursos naturais no presente “não pode comprometer a satisfação das
necessidades das gerações futuras”1. A Wikipédia apenas repercute o
homocentrismo.
Há
um reconhecimento (subentendido na definição acima): os recursos naturais são
bastante explorados atualmente. O passo seguinte, que escancara o abismo,
consiste em substituir o “não pode comprometer” por “já compromete”.
A
trajetória do homem (em relação ao meio ambiente), do Paleolítico à
pós-modernidade, resume-se em três fases mais ou menos longas: a dependência
completa, o domínio e a destruição acelerada.
Zygmunt
Bauman nos indica o caso da Ilha de Páscoa, no Pacífico, como cenário
previsível para o planeta a caminho do superpovoamento pelo homo sapiens. A Ilha de Páscoa
já foi
autossuficiente e próspera do ponto de vista econômico e cultural, desde os
tempos dos assentamentos humanos iniciais, estabelecidos no curso do primeiro
milênio; e que, no entanto, à época da chegada dos europeus, em 1772, viu sua
população reduzir-se de quinze mil pessoas para duas ou três mil um século
depois. O principal culpado e a causa imediata dessa catástrofe foram a
agricultura e a caça excessivas, resultando no desflorestamento da ilha,
seguido pela erosão da camada superficial do solo2.
Qual
o quadro se apresentaria à humanidade sobrevivente com a diminuição
catastrofista de 5,6 bilhões de pessoas? Uma redução proporcional já ocorreu na
Ilha de Páscoa, cujo território é um pouco menor que o Paraná. Ouras sociedades
colapsaram pelos mesmos motivos.
A
agricultura continua a ser a principal responsável pela agressão mais duradoura
e contundente ao planeta, malgrado os avanços tecnológicos e os métodos menos
prejudiciais, como a rotação de cultura e o plantio direto.
O
homem é o fator de insustentabilidade (desde que foi expulso do paraíso), mesmo
que desenvolva a consciência de preservação ambiental. Entre sua consciência e
a prática, todavia, coloca-se o abismo a que fiz referência acima.
NOTAS
2.
BAUMAN,
Zygmunt. Mal líquido: vivendo num mundo
sem alternativas/Zygmunt Bauman, Leonidas Donskis; tradução Carlos Alberto
Medeiros. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Zahar, 2019, p. 63.
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