O
ano era 1981. O mês, fevereiro ou março. O dia? Esse último dado já foi
eliminado por Cronos. O quando está
abaixo de o como e o porquê, na medida em que se representa
por um número. Não por uma vivência, por uma emoção.
Em
tarde de verão, embarquei no último trem entre Santiago e Porto Alegre. Triste
por deixar os meus parentes e amigos, minha terra. Difícil partida com o
coração mais pesado que a mala. Entre os papéis escassos, todavia, uma carta de
recomendação do doutor Lang. Ela me apontava, naquele momento, uma referência
no mundo desconhecido que me envolveria no final da linha. O sonho com as artes
plásticas dependia de um emprego na Capital. Princípio de realidade e princípio
de prazer (necessariamente nessa ordem).
Com
a melhor roupa (ainda modesta para entrar no edifício da Assembleia Legislativa
do Estado do Rio Grande do Sul), compareci ao gabinete do deputado para quem se
endereçava a dita carta. Mal recebido por um assessor na primeira sala, esperei
sentado por outro assessor da sala seguinte. Até hoje não sei quantos
assessores e salas constituem um gabinete de deputado estadual. A carta foi
levada à terceira sala. Talvez à quarta. Depois de uma hora, o assessor da
primeira sala (o menor na hierarquia dos assessores) me entregou o nome do meu
possível empregador: Sistema Nacional de Emprego.
Um
misto de humildade e ignorância me impediu de entender o que significava tal
encaminhamento. Por isso, fui ao SINE, onde entrei numa fila quilométrica. Pior:
não havia vaga para auxiliar de escritório. Também não me recordo se preenchi
uma ficha no balcão, a entrar para uma lista de espera. A necessidade me
obrigou a procurar trabalho nos classificados dos jornais.
Décadas passadas, ainda não corrompido pelo mal que espreita
desafiadoramente os homens de bem, compreendo o logro de que fui alvo na
Assembleia Legislativa num dia qualquer (já eliminado por Cronos), fevereiro ou
março de 1981.
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