Noventa e nove por cento da sociedade
(cristã) não sabe que alguns mitos
bíblicos foram adaptados de outras culturas. Mitos expressivos – sem os quais
não seria concebível o livro organizado pelo rei Josias e sua equipe de
sacerdotes e profetas em Judá, há 2.700 anos. Um exemplo desses mitos
emprestados para tecer a saga do povo de Israel: o Dilúvio, copiado do épico Gilgamesh –
Rei de Uruk, escrito na Suméria. A mítica distorceu consideravelmente a História,
que não é confirmada pela Arqueologia em muitos fatos narrados no livro. Exemplo: o
êxodo da Egito.
As contradições contidas no Gênesis são inumeráveis. Uma dessas
contradições constitui a primeira manifestação especista da civilização
ocidental: a espécie humana dominadora de todas as demais. Contradição mais
evidente é a criação dos animais domésticos antes de seu domesticador. A
história real (com H maiúsculo) nos ensina que a domesticação é um fenômeno
muito recente, por volta de dez mil anos atrás. Antes de serem domesticados,
todos os animais que se submeteram ao jugo do homem eram selvagens. Inclusive o
cão. Segundo o grande zoólogo Raymond Coppinger, o cão de povoado já evoluíra
do lobo (antes de agir a seleção artificial).
Filósofos e cientistas do século XX
(cujos bons exemplos são Peter Singer e Desmond Morris), foram responsáveis
por denunciar o especismo, a depreciação, dominação ou exploração das demais
espécies pelo homem. No âmbito ocidental, a genealogia dessa superioridade
encontra-se justificada mitologicamente no livro judaico-cristão.
Em Levítico,
11: 13-19, a suposta palavra de Jeová recomenda quais são as aves que não
servem de repasto humano. Na relação, inclui-se o morcego. Não sabiam os velhos
escribas da época da primeira consolidação textual da Bíblia que o morcego é um
mamífero. A propósito, Richard Dawkins escreve sobre a “árvore de parentesco”:
Que
obra magistral é o esqueleto de um mamífero! Não falo da beleza em si, embora eu
ache que seja belo. Refiro-me ao fato de podermos falar em “o” esqueleto
mamífero: o fato de uma coisa tão complexa e interligada ser tão
esplendidamente diferente de um mamífero para outro. […} Vejamos o esqueleto de
um morcego. Não é fascinante que cada osso tenha sua contrapartida
identificável no esqueleto humano? […] A mão humana e a mão do morcego
obviamente são – nenhuma pessoa mentalmente sadia poderia negar – duas versões
de uma mesma coisa.
A
mão do morcego é sua asa, cuja estrutura óssea só difere da mão humana pelo
alongamento dos ossos. Essa semelhança, que é chamada de homologia, bastaria para comprovar que o homem e o morcego, ambos
mamíferos, compartilham de um ancestral comum.
A evolução das espécies (a evolução das
formas vivas no planeta Terra) é um fato, talvez o mais extraordinário de
todos. Um fato que desmistifica o criacionismo (e outras teorias
místico-ufológicas que pregam ser o homem de natureza distinta (divina), vindo de fora e
o escambau). O desconhecimento da evolução pela seleção natural (a grande
descoberta de Darwin) é que ainda permite ao criacionista crer num mito.
Um comentário:
Caro Froilam,
Parabéns pela abordagem do tema. Sei o quanto é difícil tratar dessa questão, que é científica, mas as crenças arraigadas na nossa tradição cultural teimam em obstruir qualquer reflexão e discussão.
Abraços,
Vulmar
Postar um comentário