Em duas postagens anteriores, dissertei brevemente sobre o Eu – essa consciência da
própria interioridade em toda pessoa. Consciência que não é
equivalente a controle de tudo o que emerge da interioridade, como as
pulsões, e tampouco o controle de tudo o que imerge de fora, como a
morte na família. Mesmo assim, o Eu vive seu melhor momento na
cultura ocidental, nunca antes caracterizada por tamanha liberdade.
Em épocas passadas, não seria aceitável algumas manifestações
contemporâneas, que demonstram um individualismo radical.
Exemplifiquei-o na disputa da herança, cada vez mais agressiva entre
irmãos. Nesta aportunidade, cito outro exemplo, que, sem intenção
premeditada, também se relaciona com a morte de alguém da família.
Nessa hora extremamente dolorosa, o Eu sofre estímulos
arrebatadores, cuja soma resulta, inevitavelmente, num sentimento de
autopiedade. Sim, a pessoa chora “o que será de mim sem ele(a)”,
incapaz de transcender a si mesma. Tal transcendência é possível
com outra razão para o choro: “ele(a) perdeu para sempre a
oportunidade de viver mais momentos felizes”. Ao invés da pena de
si mesmo, sem a presença definitiva do(a) outro(a), o ágape – o
aspecto mais sublime (e menos conhecido) do amor. Isso não é
elucubração intelectual deste blogueiro, mera interpretação de
leituras psicanalíticas. Há exemplos vivos em nosso meio social,
pessoas que confessam sem problema a prévia incapacidade de
experienciar a morte de seus pais ou irmãos. Tal precipitação, no
entanto, não subentende uma dependência afetiva (como parece), mas
o incômodo sofrimento que será imposto ao seu Eu, suscetível e
hedonista. Tampouco a presciência leva a uma maior aproximação
dessas pessoas com seus entes queridos (quase incomunicáveis,
considerando-se a linguagem dos afetos).
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