quarta-feira, 6 de março de 2013

HISTÓRIA DA FILOSOFIA


4. Na Poética, Aristóteles dá à mimese — arte imitativa — um importante papel tanto para o conhecimento com para a ética-política. Exemplo disto é a definição que ele apresenta de Tragédia em Vi, 1499b. Eis um aspecto que diferencia o estagirita de seu mestre. Tendo em mente tal diferenciação do papel da mimese — principalmente a dos poetas trágicos e homéricos — em ambos os pensadores, apresente uma dissertação de trinta (30) a cinquenta (50) linhas comparando as posições de ambos. (5,0 pontos) 

MÍMESIS – UMA DICOTOMIA FUNDADORA

            Muitas e incontornáveis divergências caracterizam o pensamento de Platão e de Aristóteles, a despeito de pertencerem ao mesmo período clássico da antiga Grécia. Assim ambos são representados pictoricamente por Rafael Sanzio em Escola de Atenas, pintada em 1509, em que Platão aparece apontando o indicador para o alto (mundo ideal, inteligível) e Aristóteles estende a mão para baixo (mundo real, sensível).
            Uma das divergências entre os dois filósofos se evidencia no tratamento dado à arte imitativa, à mímesis. Na obra A República, onde há metafísica, teologia, psicologia, arte, educação, moral etc., Platão é recorrente ao tema da imitação, submetendo-o ao dialogismo no Livro III e no Livro X (neste mais demoradamente). Depois de atribuir três gêneros de narrativas na poesia e na prosa, dentre os quais um inteiramente imitativo (adequada à tragédia e á comédia), a razão socrático-platônica discorre sobre a imperfeição de toda imitação, simulacro de simulacro, concluindo por não permitir que qualquer que seja o imitador permaneça na sua cidade ideal. No entanto, ao admitir uma forma pura de imitação, quando se trata de imitar o bem, Platão submete a estética à moral. Aristóteles, em contrapartida, define a arte como “uma disposição suscetível de criação acompanhada de razão verdadeira” (Ética a Nicômaco, VI). No Livro X, o diálogo entre Sócrates e Glauco é categórico:

Sócrates – E se afirmo que a nossa cidade foi fundada da maneira mais correta possível, é, sobretudo, pensando no nosso regulamento sobre a poesia que o digo.
Glauco – Que regulamento?
Sócrates – O de não admitir em nenhum caso a poesia imitativa.
           
            A arte não está separada da moral: “Sócrates – Tomemos como princípio que todos os poetas, a começar por Homero, são simples imitadores das aparências da virtude e dos outros assuntos de que tratam, mas que não atingem a verdade”.
            O imitador não tem, de acordo com Platão, “nenhum conhecimento válido do que imita”. Isso seria uma premissa falsa para qualquer silogismo aristotélico, cujo pensamento filosófico-científico tinha por base natural os sentidos, o mundo fenomênico, a realidade. Aristóteles começa por dizer da importância das artes de imitação, entre as quais a tragédia. Define-a, no capítulo VI da Arte Poética, como sendo “a imitação de uma ação importante e completa, de certa extensão; num estilo tornado agradável”. A representação dessa ação (por atores) suscita na platéia a compaixão e o terror, o que provoca a purgação (catarse) dessas emoções.
            Segundo Luisa Severo Buarque de Holanda, para Aristóteles “as regras da mímesis poética não derivam do objeto a ser imitado (como pensava Platão), mas do efeito, ou fim desejado pela tragédia”.
            Isso pensado e expresso há mais de dois milênios, sem nada que se lhe assemelhasse até o advento da Psicanálise. Aristóteles, ao contrário de Platão, não funde à moralidade a arte imitativa. Faz desta um objeto de estudo, que ainda constitui um referencial à estética contemporânea.

            No quadro de Rafael (supracitado), não é só a atitude gestual que distingue Platão e Aristóteles. Aquele traz consigo o Timeu, diálogo em que figuram as teorias mais destacadamente metafísicas, versando sobre o demiurgo e as formas inteligíveis; este conduz Ética, em que trata da felicidade humana, sem a “exortação enfadonha de ideias super-humanas” no dizer de Will Durant. 

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