Ante
a morte, o homem é um ser inexoravelmente trágico (no sentido que Aristóteles
deu a conhecer na Poética sobre os
heróis do teatro grego). Essa característica nele se evidencia nos momentos em
que age desafiando a morte de uma forma perigosa, a despeito de sua fragilidade
(nunca autopercebida). Por mais elevada sua posição, cedo ou tarde, acaba
sucumbido pela própria fortuna, pelo próprio destino. Todo o artifício de que
se cerca não é suficiente para que tenha inteiro domínio sobre os elementos
naturais. Sua relação com o fogo, por exemplo, é desastrada algumas vezes, sobretudo
pela ocorrência de uma centelha (em contato com um material explosivo), ou pelo
volume que escapa à manipulação. Há quase meio milhão de anos, esse elemento
passou a auxiliar na sobrevivência hominídea. Principal energia para a
confecção dos alimentos, para a resistência ao frio, para a forja dos metais,
para o cultivo da roça, para a vitória nas guerras, para o puro entretenimento,
entre outras tantas finalidades. Essas práticas milenares, todavia, quando não
controladas cem por cento, resultaram em incêndios devastadores, em grandes
sinistros. Outras vezes, o fogo, provando sua origem, ocorre sem a intervenção
de seu manipulador humano. Exceto em tais ocorrências, mais raras, as demais
são de responsabilidade do homem. Antes do acidente na boate Kiss, em Santa
Maria, ninguém pensou que uma única porta era insuficiente (para saída de 1500
pessoas em caso de emergência). Ninguém pensou na inspeção dos extintores. Na
impossibilidade de acender um sinalizador contra o teto inflamável. Ninguém
pensou, ninguém fez. Antes, e não depois. A tragédia tem uma causa ontológica:
o homem. Herói e anti-herói de si mesmo.
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