terça-feira, 29 de abril de 2014

NO PAÍS DE ARANTES


Não parece que faltam tão somente quarenta e poucos dias para o início da Copa do Mundo de Futebol. 
Não parece que o evento, tão festejado pelos entusiastas desse desporto, acontecerá no Brasil. 
Isso é surpreendente. 
As lembranças da derrota brasileira em 1950, as quais justificam o recalque na consciência coletiva deste país, não me impedem de imaginar a grande expectativa vivida por aqueles que aguardavam a realização do evento. 
Certamente, a paixão que caracterizava os expectantes ainda tinha a inocência da primeira vez, sem a banalização midiática, o interesse financeiro, a projeção política, o glamour instituído pela Fédération Internationale de Football Association (FIFA), entre outros fatores escusos (das últimas duas décadas). 
Sessenta e quatro anos depois, surpreende-me que o estado de espírito dos brasileiros tenha adquirido certo amargor e criticidade próprios de uma madureza forçada, antes do tempo. 
Em alguns indivíduos, todavia, esse amadurecimento precoce corre o risco de desviá-los para a repulsa, para a agressividade ou para o ódio, ao invés da estoica indiferença. 
Tais sentimentos negativos encontram-se na origem dos discursos e das manifestações de rua avessos à realização da Copa no Brasil.
Independentemente do êxito ou do fracasso da seleção Canarinho, ideias e ações poderão balançar as frouxas estruturas que mantêm nossa sociedade mais ou menos feliz. 
Os desapaixonados, entre os quais me incluo, somos responsáveis pela falsa aparência de que tudo está como dantes no país de Arantes (do Nascimento). Isso mudará, não há dúvida, daqui a quarenta e poucos dias, quando os brasileiros sofrerão uma recaída verde-amarela*.


* Johan Huizinga escreve que o homo ludens sempre se coloca ao lado e um pouco abaixo do homo sapiens.

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