I
A
comunicação não dialogal é sempre insuficiente e denuncia um abismo profundo
que a transcende nas relações intersubjetivas, entre Eu e Tu. As chamadas
redes sociais constituem-se, por excelência, nessa interação pretensa do tipo sujeito-objeto. Por que pretensa? Embora admitida como possível,
a interação só ocorre com a relação sujeito-sujeito.
O Eu necessita de Tu, ante o qual, Eu também passe à condição de Tu.
Entre Eu e Tu instaura-se o ser
pessoa. Eu é pessoa, na medida em que
é Tu em toda relação intersubjetiva.
O problema da comunicação não dialogal é insignificante diante dos afetos que
se formatam a partir do modelo sujeito-objeto.
II
O
Eu não vê no outro alguém semelhante
a si, não vê no outro o Tu. Essa
limitação não é imposta por antolhos, mas por natureza da própria visão, ab origine condicionada a ver seu Eu como referência. A psicologia criou
muitas definições para essa característica primária do Eu: egocentrismo, individualismo, solipsismo... A imagem criada por
Nietzsche, de ser o homem “uma corda distendida entre o animal e o além do
homem”, empresta-se ao caso com uma variação nas ancoragens: uma corda
distendida entre o Eu e Tu. Essa travessia é necessária para o
surgimento da pessoa, o além do Eu.
III
As
características primárias do Eu sintetizam-se
na relação sujeito-objeto. O Eu como sujeito e tudo mais como objeto.
O Tu inexiste nessa relação. O máximo
que o Eu concebe é Ele, interlocutor ausente, bode
expiatório de tudo o que há de errado no mundo. Nada é enunciado pelo Eu como autocrítica, apenas queixumes de
incompreensão, injustiça, desamparo. Deseja ser admirado, ser amado, mesmo sem
o Tu (alijado da presença).
IV
A relação sujeito-sujeito é condição necessária para
a civilidade, impedida por um avanço açambarcador do individualismo nestes
dias. O mundo anda mal das pernas, da cabeça e do coração, dizem inclusive
aqueles que contribuem para isso. O que fazer para o mundo andar bem? A
travessia acima citada alegoricamente é algo muito sério, porque remete, medias in res, ao processo de
transformar indivíduos em pessoas.
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