Caso um livro fosse
avaliado apenas por sua introdução, penso que Assim falava Zaratustra, de Friedrich Nietzsche, colocar-se-ia entre
as melhores construções do intelecto humano. O Prólogo elenca uma série de enunciados admiráveis, que tratam de
uma verdade nunca antes expressa direta ou metaforicamente.
Na primeira leitura
que fiz desse livro, em 1984, uma ideia me chamou imediatamente a atenção: “O homem é uma corda estendida entre o animal
e o super-homem; uma corda sobre um abismo”. Destaquei outras ideias nessa
oportunidade, como “O homem existe para ser superado” (na mesma linha da
supracitada), “Amo aquele que se envergonha quando vê os dados caírem a ser
favor e que então pergunta: ‘Acaso serei um jogador honesto?’”, ou “É preciso
ter ainda um caos dentro de si para gerar uma estrela dançante”.
Com o símile “é uma corda
estendida”, Nietzsche lança mão da linguagem poética, pouco empregada na
filosofia e na ciência, sistemicamente referenciais. O homem é uma corda,
embora possa parecer um equilibrista, como se entende na frase que complementa
a metáfora: “Perigosa para percorrê-la, é perigoso ir por esse caminho,
perigoso olhar para trás, perigoso tremer e parar”. Uma corda com sentido
único, em que não há caminho de volta (se é perigoso olhar para trás). O abismo
fica em aberto, talvez o salto da transcendência, talvez a morte. Interessante
é a extremidade para onde o homem se encaminha na travessia (ou superação) de si
mesmo: o super-homem.
Mais que outra
metáfora, super-homem (ou além do homem) constitui um dos pontos centrais dessa
obra extraordinária. A superação do homem por ele mesmo significa o triunfo das
forças ativas sobre as reativas (ressentimento, má consciência, ideal ascético),
que “constituem em primeiro lugar as formas do niilismo”, segundo as palavras
de Deleuze. No lugar de superação,
Nietzsche emprega o termo passagem e,
mais apropriadamente, declínio. Ser
um declínio é motivo para se amar o homem.
Logo após o Prólogo, o leitor dispõe do primeiro
discurso de Zaratustra, As três
metamorfoses, que o manterá interessado na leitura. Nenhum outro livro da
história da filosofia, lido até a última página, desperta a vontade de lê-lo outra
vez. Isso ocorre em vista da sabedoria que ofusca num primeiro momento.
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