Já
escrevi que a vida pode ser comparada a uma viagem de trem (movido pelo tempo).
Dois vagões seguem engatados ao nosso, com acesso negado: o passado (atrás) e o
futuro (à frente).
Hoje
faço um acréscimo ao texto, incluindo sentimentos que nos forçam a denegar o
presente, contrariando uma das grandes lições da Filosofia. Quais sentimentos?
Em relação ao passado: a saudade (decorrente de vivências felizes), o ressentimento
ou a culpa (decorrentes de vivências ruins). A saudade nos instiga a cotejar o
passado ao presente, com inevitável depreciação do último. O ressentimento e a
culpa (conta)minam nosso agora, uma vez que somos incapazes de perdoar ao outro
ou - o que é mais complicado - a nós mesmos. Em relação ao futuro: a esperança
e o medo. Dos males que afetam nossa existência, a esperança é tida como um bem pelo Cristianismo, uma das três virtudes teologais.
No dizer de filósofos modernos, ela é da ordem da falta, da "tensão
insatisfeita". Em sua quinta potência, a esperança chega a engendrar outro
mundo, outra vida, em depreciação desta, que é real. Por outro lado, o medo do
futuro é ainda pior, causando maior dano ao presente. Medo de doenças, medo da
velhice, medo da morte. A esperança nos faz crer numa transcendência ilusória,
o medo nos faz pensar na finitude inexorável.
Por
que não nos libertamos do passado? Por que continuamos a nutrir esperança num
futuro melhor (sempre adiado)? Por que não perdoamos aos outros e tampouco a
nós mesmos? Por que ainda temos medo da morte (a despeito de nos dizermos
cristãos)?
A resposta a tais indagações nos obriga a reconhecer que não valorizamos a
vida presente, não amamos suficientemente as pessoas que viajam conosco, dentro
do mesmo vagão, onde cada instante é uma prova de eternidade.
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