As denúncias de desperdício de água, com a lavação de calçada, por exemplo, começaram na chegada do verão. Naqueles dias de estio, poucos imaginariam a situação presente, oito meses depois. Em meados de agosto, um plano emergencial levou à encampação dos poços artesianos da cidade (que ainda forneciam água). No interior do município, enquanto isso, os poços logo se exauriram. Alguns de seus usuários acreditavam numa forma de abastecimento infinito, como o caso de um senhor que colocava água em seu açude durante a noite. Outra medida de emergência foi captar água do rio Rosário, onde se improvisou uma microestação de tratamento. Caminhões-pipa afundam a estrada com o transporte do líquido escasso, distribuindo-o exclusivamente para a confecção de alimento. As empresas de distribuidora de água não atendem a demanda centuplicada pelas bombonas azuis. Inversamente proporcional à falta de água, passa a sobrar matéria fecal mal-acondicionada nos vasos sanitários que se fixam no alto dos tubos de PVC. Mais de 50% das residências se encontra com seus banheiros lotados. Dentro dos maiores condomínios, mais perceptivelmente, ocorrem as primeiras reclamações de poluição olfativa. A presença incorpórea da merda ultrapassa as fronteiras de cimento e o raio alcançado pelo Bom Ar. O mau cheiro das latrinas abertas no fundo dos quintais impede as emanações mais sutis das flores que se antecipam à primavera. Não há lugar para a poesia no momento atual. Nenhuma obra futura na Terra dos Poetas é mais importante que a ampliação da barragem. Meio metro que se levante no vertedouro (não confundir com vertente) equivale a quase uma nova barragem, necessária para dar conta do maior consumo.
(Continua na próxima edição.)
Texto publicado no Expresso Ilustrado.
Um comentário:
Caro Froilan, falei hoje pela manhã como Sr Enio Kinzel, me disse que segunda estará na promotoria para provocar uma reação do poder Público sobre o fato.
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