No âmbito da ficção, as lambanças de condomínio já renderam bons livros e, no da realidade, provocou algumas mortes (o que é sempre ruim). No primeiro dia, após minha mudança, assisto ao maior bate-boca entre duas vizinhas: 212 versus 213. O barraco começou em decorrência do trabalho de uma marreta contra a parede externa do edifício. Às 8:30 h., encontro uma jovem descalça na escada, vestindo um blaser masculino sobre a camisola. Ela fala com dois rapazes a respeito do silêncio obrigatório àquela hora. Pergunta-me se é no meu apartamento, respondo-lhe que não. O barulho vem do 213, logo abaixo. Ela toca a campainha para alertar seus moradores que há uma ordem no condomínio... Não passam cinco minutos, a jovem aparece à janela de seu apartamento, reclamando com os rapazes que instalam um ar condicionado. Eles dizem que é rapidinho. De repente, de dentro do 213, surge uma senhora a gritar com a outra. A troca de ofensa é uma coisa espetacular, a ponto de acordar os dorminhocos que agüentavam as marretadas. “A casa é minha, bato até quando me der na telha, sua vagabundinha descontrolada”, ataca a do 213. “Não sou eu a descontrolada, sua ignorante”, defende-se e contra-ataca a do 212. Da posição confortável de neutralidade, penso que ali se configura mais um conflito de gerações: a da jovem, que se deita às seis da manhã e se levanta depois do meio-dia; a da senhora, que se acorda cedo, depois de uma longa noite de sono. As duas não se entendem e tampouco se aturam. Quando indivíduos dessas gerações são obrigados a dividir espaços menores, como o de um condomínio, o choque é inevitável.
(Crônica)
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