A noção moral de certo e errado precede o religioso, caso contrário o homem não teria sobrevivido longos milênios antes de pensar a existência da alma transcendente, de Deus e de todos os mitos que constituem as religiões. A organização social em família, clã, tribo e comunidades maiores é uma característica do homo biologicus.
Alguns pensadores da ética, teístas inconfessáveis,
recorrem à frase de Dostoiévski, de que sem Deus tudo seria permitido. Tenho
minhas dúvidas se os citadores de Dostoiévski leram seu Os irmãos Karámazov.
A citação é descontextualizada, tomada como uma afirmação. Na verdade, é uma
pergunta. Mítia narra a Aliocha o diálogo que teve com Ivan (os três irmãos
Karamázov): “Ivan não tem Deus... Eu lhe perguntei: ‘Então, nessas condições,
tudo é permitido?’” (p. 682).
A despeito de Dostoiévski ser um
cristão ortodoxo, não afirma que sem Deus tudo seria permitido. O “sim” da
resposta é um dos pressupostos. Há o “não”. Não li até o presente que se
tudo é permitido, também o é a moralidade sem Deus. Dizer que haveria um
retorno à horda se a não existência de Deus viesse a ser confirmada já reflete
o espírito cristão, propenso a depreciar o homem natural.
Nenhum comentário:
Postar um comentário