quinta-feira, 5 de agosto de 2021

TIPO BRASILEIRO

        Pero Vaz de Caminha, escrivão da armada portuguesa que chegou a este continente em 1500, escreveu ao rei D. Manuel I:

A terra em si é de muito bons ares... Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. Porém o melhor fruto, que nela se pode fazer, me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar. [...] Quanto mais disposição para se nela cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber, acrescentamento da nossa santa fé.

         Por que cito Caminha?

         Não é para trazer à baila a questão dos nativos, que deviam ser salvos pela doutrina cristã. A primeira coisa que diria a esse respeito é de que houve uma perdição imposta pela cultura eurocêntrica.

         A citação acima serve de mote para analisar meu patriotismo, o qual se encontra sub judice, nas mãos de um juiz extremamente (auto)crítico – a própria razão.

         No ano 2000, participei de um concurso nacional entre os universitários, que consistia em escrever uma carta aos portugueses, a tematizar tudo o que o Brasil tinha de melhor no presente.

         Sobre o território brasileiro, descrevi sua multifacetada natureza geográfica com a minúcia que faltou ao missivista apenas desembarcado de além-mar. Duas décadas mais tarde, não mudaria uma vírgula da descrição.

         O problema está em sua gente. Os índios não foram salvos ao longo da colonização e da nação independente. Hoje descrevo o povo como um motivo para repensar meu patriotismo. Mais que representá-lo no poder, os políticos constituem uma amostra do tipo brasileiro – para o qual não há salvação.

         Mario Quintana foi preciso: “Se eu amo o meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?”. 

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