sábado, 8 de agosto de 2015

NOITE, MORTE E SEUS ASSOMBROS


A noite foi, com toda certeza, a mãe do medo humano. Ela gestou em suas entranhas as criaturas mais horripilantes: bichos-papões, fantasmas, espíritos do mal...
Esses seres disformes aterrorizaram a infância da humanidade, cujos memes ainda se manifestam mais uma vez no indivíduo (ao longo de seus primeiros anos de vida).
A adoração ao Sol, observada em quase todas as culturas, originou-se no fato de a luz dele advinda dissipar a escuridão a cada dia. O horror ficava restrito aos sótãos e porões, às florestas fechadas, ao mundo subterrâneo…
Antes do culto solar, o homem primitivo conheceu o fogo e o domesticou, para, entre outros empregos, proteger-se das assombrações noturnas.
Durante o primeiro estágio da evolução religiosa, chamado de animismo, nossos ancestrais endeusaram elementos ou fenômenos naturais. O próprio Sol não escapou dessa mitificação, para o qual se rendeu culto (inclusive com o sacrifício humano). O trovão, outro exemplo, foi personificado como “senhor do raio”, que poderia fulminar um indivíduo inescapavelmente.
A morte, mais assombrosa que todas as noites juntas, desencadeou um outro processo de mitificação (ainda inconcluso). Não sendo possível evitá-la, arranjou-se uma forma de transcendê-la. Nenhuma religião foi mais pretensamente exitosa nesse mister do que o Cristianismo, que vige atualmente graças à promessa de vida eterna a partir do mito fundador: a ressurreição de Jesus Cristo.
Com a revolução industrial, o homem passou a morar em cidades cada vez maiores e melhor iluminadas, vindo a perder o medo da noite. Em relação à morte, todavia, ele continua a temê-la instintiva e racionalmente.
A mitificação de uma outra vida além da “cova gélida e escura”, Nietzsche percebeu isto muito claramente, conspirou contra a vida terrena, real e única, enchendo-a de medos e dúvidas novos. 

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