terça-feira, 1 de abril de 2014

INDIVIDUALISMO (AUTO)FOTOGRAFADO


O uso do telefone celular expõe um novo modo de existência até então inibido pela religião, pela lei, pelo socialmente correto, pela consciência de alteridade: a do individualismo radical. 
Todo indivíduo, independentemente de idade ou condição financeira, possui um aparelho conectado à telefonia móvel. De uma hora para outra, criou-se a imperiosa necessidade de usá-lo. A partir desse uso generalizado, o telefone fixo virou peça de museu, e o “orelhão” foi arrancado da paisagem urbana. 
A princípio, todo mundo ligava e todo mundo atendia. 
Essa relação de reciprocidade, todavia, logo entraria em crise, denunciando a nova moralidade. 
A percentagem de não atendimento das ligações passou a aumentar dia após dia, e a maior razão para que tal ocorresse não se deve à falta de tempo do destinatário, mas à sua conveniência, ao seu interesse. (A conveniência ganha outro nome, caso a ligação não seja prontamente identificada no display: segurança. A clonagem de celular é a mais séria ameaça à individualidade, tão superestimada até então.) 
Um exemplo muito claro (ou muito vivo) de ligação inconveniente é a feita do trabalho para quem se encontra de folga. Outros exemplos: de uma instituição bancária (com o fim de fazer um seguro qualquer); de uma pessoa reconhecidamente chata. 
À exceção dessas ligações, em que se justifica o não atendimento, a inconveniência é puramente subjetiva, premeditada. Tal subjetividade é cada vez maior (e menos justificada), diretamente proporcional à livre expressão do individualismo. 
O último momento desse individualismo é facilmente visualizado na mania que toma conta dos usuários de todas as nacionalidades: selfies, ou a fotografia tirada de si mesmo com o celular. A propósito, o recurso veio incrementar o Facebook, uma rede de exposição despudoradamente individual. 

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