Deixo
de ver televisão ou de me sentar à frente do computador (para
atualizar este blog, jogar xadrez online, informar-me com as últimas
notícias), para ler um bom romance. À presentidade, à vulgaridade,
ao realismo sensacional, prefiro a atemporalidade clássica que me é
propiciada pela estética da criação verbal. Leio há quarenta anos
e não sei como mensurar todos os benefícios que me trouxe a
leitura. O mais evidente é este que me colocou na condição de
sujeito da enunciação, do discurso, também produzindo textualmente
para que outros leiam. Esta coluna, por exemplo, completará dez anos
em dezembro. No letramento em que me realizo como pessoa, a leitura
continua tão (ou mais) importante quanto a escrita. Por um lado,
lançarei um livro poético; digitalizei e atualizei Trovas
da Estância do Abandono de Da. Brasília Comarca,
de Zeca Blau (que será lançado em comemoração aos oitenta anos de
sua primeira edição); elaborei o editorial para o informativo da
próxima Feira do Livro de Santiago. Por outro, leio e leio. Domingo
passado, concluí a leitura de Sepé
Tiaraju - Romance dos Sete Povos das Missões,
de Alcy Cheuiche. Já lera O
mestiço de São Borja,
do mesmo autor. Ao longo desta semana, leio A
mulher do espelho,
igualmente de Cheuiche. Por que lê-lo? Para melhor recebê-lo em
nosso evento cultural, a princípio. Como poderei dialogar sobre
literatura com o homem se não conheço sua obra. Lendo seu Sepé
Tiaraju,
romance histórico, indianista e trágico (no sentido dado pela
tríade grega: Ésquilo, Sófocles e Eurípedes), volto a pensar no
grande crime cometido pelos portugueses e espanhóis – ao dizimarem
um povo a ferro e fogo. Recomendo a leitura desse livro.
segunda-feira, 30 de setembro de 2013
quinta-feira, 26 de setembro de 2013
CONSIDERAÇÕES SOBRE A POESIA
Ente entre os entes, evoluindo ao longo de alguns milhões de anos, o homem criou a linguagem, a palavra articulada ou escrita. A partir desse instrumento, ele se tornou um ente especial. O mundo adquiriu um significado comunicável. Nesse aspecto, a linguagem é uma construção tropológica, uma metáfora fundadora. Em determinado momento da antiguidade romana, por exemplo, a palavra rius passou a significar o curso de água (relativamente volumoso). A coisa em si, ou melhor, o que aparece da coisa em si é transposto para o âmbito verbal, cujo emprego sistemático fixou-se como referencial.
Paralelamente à apreensão da realidade fenomênica, a linguagem serve para o melhor entendimento entre seus usuários, efetivando-se nas relações cotidianas, superficiais. Para viabilizar "relacionamentos mais profundos", Goethe escreve, outra linguagem passou a ser engendrada dentro da linguagem mesma - a poética. A palavra rio, mais que representar um curso de água, foi empregada para significar outro fenômeno (natural ou não), que realiza um fluir constante. Essa ampliação semântica por associação constitui a metáfora.
O meu poema TEMPO
O tempo é rio, e o homem, um barqueiro,
sempre contido pelas margens, sempre
guiado pela vívida corrente
até o mar imenso e derradeiro.
Ele manobra o barco inutilmente,
esperançoso de um lugar costeiro
com águas mansas, porto hospitaleiro,
onde a felicidade...
Profluente,
o rio continua seu deságue
- devir que impõe ao ser a condição
indefinida entre o terror e a blague.
Além das margens, o desconhecido,
a singularidade, o tempo não
há fora do homem (pelo tempo ungido).
começa com um símile, que já é o segundo passo para a constituição metafórica: o tempo é rio. (O primeiro passo é a comparação, em que aparece a partícula "como".) A metáfora pura ocorre, literalmente, com um salto significativo: o rio continua seu deságue. A palavra tempo foi substituída. O termo substituto, rio, arrasta outro, deságue, com o qual mantém uma relação semântica. O verso todo, que uma sucessão sintagmática, transforma-se em discurso poético.
O poeta é o sujeito desse discurso, cuja forma se distingue da prosa pela disposição paralelística, pela recorrência da medida e da rima.
Na efetivação de "relacionamentos profundos", a linguagem da poesia excede a função comunicativa, para constituir uma expressão estética, capaz de sensibilizar os espíritos mais contemplativos.
domingo, 22 de setembro de 2013
ALCY CHEUICHE
ALCY
CHEUICHE será um dos escritores que virá à nossa 15ª Feira do
Livro de Santiago (entre 24 e 27 de outubro). Cheuiche nasceu em
Pelotas , no ano de 1940. Um de seus ascendentes genealógicos foi o
Barão de Cerro Largo, que lutou na Revolução Farroupilha, ao lado
do Império. O escritor residiu em Alegrete, Porto Alegre, França,
Alemanha, São Paulo, Campos do Jordão e, atualmente, na capital
gaúcha. Formou-se em Veterinária. Casou-se três vezes, pai de
cinco filhos: Luiza, Luciano, Mário, Márcio, Zilah. Em
1996, assumiu o Instituto Estadual do Livro. Em 2006, foi patrono da
Feira do Livro de Porto Alegre. Entre suas obras, destacam-se os
romances O gato
e a revolução; Sepé
Tiaraju (romance
dos Sete Povos das Missões), O
mestiço de São Borja, A
Guerra dos Farrapos, Ana sem terra, Lord Baccarat, A mulher do
espelho, Nos céus de Paris (romance
da vida de Santos Dumont), Jabal
Lubnan; os livros de
crônicas O planeta
azul e Na
Garupa de Chronos; a
peça dramática O
pecado original; e os
livros de poesia Meditações
de um poeta de gravata, Entre o Sena e o Guaíba, Versos do extremo
sul. Estou
concluindo a leitura de O
mestiço de São Borja,
romance histórico que começa em São Borja (com a Revolução de 30
e 32, a campanha na Itália, as tentativas de golpe em 1945, o
suicídio de Vargas, as eleições de Jânio Quadros, a Legalidade de
Brizola, 1964, o Ato Institucional de 1968 como pano de fundo) e
termina em Estocolmo, em 1980 (com a entrega do Nobel de Medicina aos
familiares do Dr. Osvaldo Winterfeld, o mestiço, personagem que
morre em acidente logo após receber a notícia da láurea). Em
seguida, pretendo ler Sepé
Tiaraju e a Mulher
do espelho. Com
essas leituras, penso estar habilitado a conversar com o escritor.
Outras
visitas ilustres: Jane Tutikian, Léia Cassol, Cláudio Levitan, Thedy Corrêa
e Paulo Bocca.
quinta-feira, 19 de setembro de 2013
NOVO PATRONO
O escritor, ensaísta e professor LUÍS AUGUSTO FISCHER foi escolhido há pouco o novo patrono da 59a edição da Feira do Livro de Porto Alegre, que ocorrerá de 1 a 17 de novembro de 2013.
Os outros concorrentes eram: Airton Ortiz, Caio Riter, Celso Gutfreind, Cíntia Moscovich, Cláudia Tajes, David Coimbra, Fabrício Carpinejar, Franscisco Pereira Rodrigues e Maria Carpi.
Fischer é professor de Literatura na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Natural de Novo Hamburgo, nascido em 1958. Colunista do Zero Hora, é autor do Dicionário de Porto-Alegrês, Rua desconhecida e Edifício ao lado da sombra, ambos de contos, Quatro negros (novela), entre outros.
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
O GRANDE MITIFICADOR
Nestes dias, fala-se (e escreve-se)
amiúde sobre uma identidade gaúcha, que distinguiria sobremaneira o homem
nascido no Rio Grande do Sul. Qualquer brasileiro de outros estados ou regiões,
que nos visitasse agora, aceitaria essa identidade sem pensar duas vezes.
Ao pensar duas vezes, todavia...
A Semana Farroupilha excede em ufanismo,
sentimento ou atitude que representa a fina flor da gauchidade. O Hino
Rio-Grandense (musicalmente produzido por um mineiro) sobre-exalta as nossas
façanhas. Mas que façanhas?
Tampouco o orgulho separatista serve de modelo a
alguma parte da Terra.
Nossa pátria mítica, a princípio, não passou de um
ideal forjado pelos líderes farroupilhas. Estes eram descendentes de
portugueses, do mesmo povo que colonizara o Brasil como um todo. Eles falavam a
mesma língua portuguesa (com certeza). Revolucionários e imperialistas.
Republicanos e monarquistas.
Índios e negros nunca tiveram vez. Os
primeiros foram dizimados covardemente na chamada Guerra Guaranítica (com o
apoio dos espanhóis). Os outros, escravizados, traídos em Porongos.
Que
liberdade apontava o Vinte de Setembro? Liberdade política ou econômica?
Seríamos liberais e viveríamos exclusivamente do charque? Separados do Império,
seguiríamos sua política de povoar o território com imigrantes europeus?
Depois
dos alemães e italianos terem povoado metade do nosso território cordiforme,
podemos falar numa identidade gaúcha? A bombacha veio de fora. O cavalo
veio de fora. A música veio de fora (segundo dizem, o hino seria plágio de
Strauss). O churrasco (asado) é o prato nacional do Uruguai e da Argentina. O
chimarrão (mate) é um legado da cultura indígena (quíchuas, aimarás e guaranis).
Criação rio-grandense autêntica é o MTG. Há tão somente 46 anos. O grande
mitificador. Essa organização não cessa de criar regras para o que seja a
identidade do gaúcho.
domingo, 15 de setembro de 2013
PERMISSÃO PARA GAUDERIAR
O diálogo sobre gauchidade (acampamento farroupilha, piquetes etc.) se amplia na blogosfera. O Ruy Gessinger sabe provocar o debate. Desta vez com um despretensioso registro fotográfico. A propósito, numa das fotos alguém faz uso do telefone celular. Ontem, ao passar um piquete aqui na Pinheiro Machado (em frente ao Fórum), observei que os dois cavaleiros da ponta traziam a mão ao ouvido. Obviamente, usavam o celular. O MTG permite isso? Ninguém ainda disse que o celular é uma forma de permissão, sem a qual o gaudério não estaria ali, naquele exato tempo e lugar.
sábado, 14 de setembro de 2013
POESIA
Primeira amostra do livro Poesia, que reúne meus poemas em margens impossíveis, e os da Erilaine em rosa de nanquim. Lançamento previsto para a Feira do Livro de Santiago, de 24 a 27 de outubro de 2013.
terça-feira, 10 de setembro de 2013
NATUREZA VERSUS ARTIFÍCIO
Neste recanto do
Hemisfério Sul, o mês de setembro constituiu um momento especial,
em razão de manifestações naturais e humanas.
A Natureza se renova
ciclicamente com a chegada da Primavera, acontecimento que, por si só,
mereceria uma grande festa. O artifício, todavia, pretere essa
oportunidade em favor de datas históricas: a da independência do
Brasil e da revolução farroupilha. Neste aspecto, o sentimento de
nacionalidade é incomparavelmente mais importante que a vida a se
renovar numa profusão de brotos e flores.
A despeito da cultura ser a principal ferramenta na evolução autoconduzida pelo homem, com a produção
de valores inegáveis, ela se presta para alimentar o poder no
espírito de seu agente e beneficiário. Esse poder, sempre
acompanhado de arrogância, vaidade e egoísmo, rompe com a natureza.
Quanto mais complexas as sociedades, maior o efeito da ruptura,
chegando à destruição do meio ambiente.
A independência econômica
de todas as nações é mantida graças à vultosa exploração dos
recursos naturais. Esse é o ônus obrigatório pelo bônus da
independência político-administrativa. Quando os recursos não são
suficientes, depende-se de outros países (credores).
O Haiti se
orgulha de ser o primeiro país latino-americano a proclamar sua
independência e é a sociedade mais pobre deste continente. Muito
próximo dele, Porto Rico abriu mão de sua independência e é uma
economia muito dinâmica do Caribe.
Uma das maiores festas no Brasil
comemora sua independência de Portugal. Para mantê-la, seguimos o
exemplo dos países exploradores.
No Rio Grande do Sul, comemoramos a
independência que ocorreu e a que não ocorreu. Até o dia 20 de
setembro, esquecemo-nos do grande advento da Primavera. Depois
atribuímos um dia à árvore e ao seu algoz (o fazendeiro).
domingo, 8 de setembro de 2013
LUA E VÊNUS
Há pouco, contemplava o céu na Praça Moysés Vianna, sentado num banco em frente à Igreja Matriz. Chamei a atenção das pessoas que me acompanhavam no fim da tarde, para que olhassem para a Lua e Vênus.
A contemplação não exige conhecimento. O próprio eu de quem contempla tende à autoanulação (como ensinava J. Krishnamurti).
Somente agora, em frente ao meu computador, arrisco dizer que a proximidade entre a Lua e Vênus é aparente, ocorre em razão de um alinhamento. A despeito de ser o planeta a orbitar mais próximo da Terra (e apenas 650 km menor, com base em seu diâmetro), Vênus está a aproximadamente 40 milhões de quilômetros de distância. A Lua está a 384.400 km.
sábado, 7 de setembro de 2013
CRISTÓVÃO PEREIRA
Ontem fui ao Colégio Cristóvão Pereira para falar com alunos que trabalharam meus últimos artigos de opinião do Expresso Ilustrado.
Depois de um pequeno problema com o projetor, desafiei o auditório para o diálogo. Estava ali para dialogar, não como sujeito exclusivo do discurso. Inicialmente, citei Mikhail Bakhtin, insistindo para que os alunos se manifestassem, que reconhecessem a importância de se tornarem também sujeitos do discurso. Cidadania é igual a essa condição de letramento generalizado. Esse é o objetivo maior da educação. Antes de encerrar, mostrei um vídeo que amalgama psicanálise, filosofia e astronomia (associando todo conhecimento, coerente com o novo paradigma proposto por Edgar Morin. Para finalizar, propus tornar filósofos todos os presentes com uma pergunta: Por que existe algo ao invés de nada? Essa pergunta está formulada na Introdução à Metafísica, de M. Heidegger. Minha participação no diálogo valeu a pena: uma aluna se levantou e me disse que havia gostado demais da conversa.
PESADÃO VERSUS BEETHOVEN
Na
segunda-feira, perguntava-se sobre o que escrever para esta coluna. Enquanto
aguardava o sinal abrir na Tito Beccon (para entrar na Pinheiro Machado), o
tema surgiu sem dificuldade. Ouvia a Symphony
nº 6, de Beethoven num volume aceitável por ouvidos normais. Do automóvel
ao lado, em contrapartida, o som se propagava num volume excessivamente alto.
Por alguns segundos, o funk pesadão se sobrepôs à Pastoral. Felizmente, o verde me permitiu arrancar e dobrar à
direita. O outro seguiu reto. Há duas semanas, escrevi sobre o volume alto,
responsável por um crescente problema de audição entre os jovens. Em razão do
pouco espaço, não perguntei por que alguém ouve música dessa forma. A resposta
não pode ser tão comodamente o gosto
pessoal, a mesma resposta para o usuário de fones de ouvido e para condutor
de carro rebaixado. Aquele é introspectivo, fechado em si mesmo; este é
expansivo, entrão, debochado, convencido de que sua preferência deve ser
admirada, respeitada como expressão cultural das últimas décadas. Ao problema
de surdez soma-se o da falta de sensibilidade estética. Aqui a seguinte
pergunta é impostergável: por que alguém prefere o funk pesadão à música
erudita? Mais que gosto pessoal e subdesenvolvimento, a resposta necessita se
remeter às causas do subdesenvolvimento, variáveis sociais que determinam o
próprio gosto pessoal. O indivíduo não tem escolha, seu gosto recai sobre o
estilo musical mais executado no momento, originado nos bailes das favelas cariocas.
O funk atrai por seu discurso clandestino, antipolicialesco, imoral, e na
sexualização. . Batida e discurso que alienam corações e mentes, negando à
massa de basbaques a evolução para um estágio intelectual e afetivo que
contemple a música de Beethoven (por exemplo).
(Coluna do Expresso Ilustrado, edição de ontem.)
quinta-feira, 5 de setembro de 2013
ENTRE PALAVRAS
há dis
curso
entre..........................palavras
que...........................levanta
catedrais
(Do livro Vozes e vertentes, 2010.)
domingo, 1 de setembro de 2013
FALECIMENTO
Muito triste a notícia que circula no Facebook neste momento: o falecimento de seu Gibelino Minuzzi. Como não chegou à blogosfera, vou me certificar desse fato tão lamentável para a sociedade santiaguense.
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