domingo, 31 de outubro de 2010

INVERNO OU VERÃO

Todos os anos, ouço reclames contra o frio que faz alguns dias no inverno, quando as pessoas confessam abertamente sua preferência pelo verão. Antes de dezembro chegar, elas são coerentes ainda em repudiar aquela estação. Paulatinamente, a temperatura se eleva, seca até a raiz das gramas e a substância de que é feito nosso corpo parece derreter. Sem demora, os mesmos reclamantes (meses atrás) passam a criticar o calor insuportável. 
Tamanha incoerência nos gostos e irresponsabilidade na escolha se justificam na medida em que tais pessoas são hedonistas e nada mais. Noutras palavras, vivem em função do prazer imediato, umbiguista e sensual. 
Neste dia, faz-se a opção entre Serra e Dilma. 
Os números propiciados pelas pesquisas indicam a vitória da candidata. Os votos que a elegerão são de duas procedências: dos petistas e da massa alienada que se move para lá e para cá como um tsunami. Daqueles fundamentalistas, militantes de três décadas, a Dilma terá apoio sempre, independentemente do êxito ou do fracasso de seu governo. Da massa de votantes que a elege hoje hei de ouvir reclamações futuras, na medida em que são pessoas irresponsáveis com suas próprias razões. Muitas (des)mentirão a si mesmas, jurando que não votaram em Dilma. Isso é compreensível, em vista de se adquirir o direito perdido no momento da escolha (justamente hoje, 31 de outubro de 2010). 
Caso Serra fosse eleito, a tese acima continuaria válida. Dessa forma, não há como adiantar qual a opção certa. O que se comprova equivocada é a irresponsabilidade com a escolha.
Da parte que me cabe, já assumi a responsabilidade: prefiro o inverno. Mais de uma vez, reclamarei dos dias quentes que virão. 

sábado, 30 de outubro de 2010

PRESIDENTE - PRESIDENTA

A língua portuguesa teve origem no latim vulgar, falado pelos romanos na Península Ibérica (desde 219 a.C.). Esse latim era bem diferente do falado ou escrito pelos grandes oradores ou poetas de Roma, entre os quais destacam-se Cícero e Ovídio. Na evolução posterior da "última flor do Lácio" é que os estudiosos passaram a tomar o latim clássico como referência etimológica, o que nunca impediu a inserção de outras línguas (no Brasil, as faladas pelos índios, pelos negros e pelos imigrantes).
O parágrafo acima infere dois aspectos interessantes: a língua é imutável, fixa, sujeita a regras que a normatizam e é dinâmica, flexível, sujeita a mudanças. A escrita segue o padrão e a fala inova. Quando a inovação é aceita pela maioria dos falantes, começa a ser aceita também pelos escritores e gramáticos. Exemplo perfeito é o feminino de presidente: presidenta.
Há pouco tempo, presidente era considerado particípio presente (ou ativo) do verbo presidir. Não formava o feminino com a desinência a. Isso era inconcebível. Do particípio ativo passou a constituir um substantivo de dois gêneros. O artigo determina o masculino e o feminino: presidente, a presidente.                                                                                                          
O povo começou a falar presidenta e os grandes dicionaristas já incluem a novidade no universo léxico da nossa língua. O Grande Houaiss (para citar o mais volumoso dicionário brasileiro) registra o seguinte: presidenta s.f. 1 mulher que se elege para a presidência de um país (a p. da Alemanha) 2 mulher que exerce o cargo de presidente de uma instituição (a p. do Centro Cultural) 3. Mulher que preside algo (a p. da sessão do congresso) 4 p. us. mulher do presidente.                                                                                                                                      
Diz-se que a língua é machista, e é. A definição 2 acima o prova.                                         
Dessa forma, somos testemunhas de uma evolução que não trai a origem popular, vulgarizada ou enriquecida com a participação dos falantes. A sociolinguística contribui enormemente na rápida oficialização dessas inserções, para o dissabor dos gramáticos mais conservadores.
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O João Lemes, ao defender uma escrita mais coloquial possível para o Expresso Ilustrado, de maior alcance popular, está certíssimo em determinar que seus redatores grafem presidenta, chefa, generala...  
Obviamente, por uma questão de estilo até, a opção por a presidente ou a presidenta continuará sendo facultativa.                                                                                                            

JOHN KEATS

                                                                           
Em 25 jun 10, postei sobre o filme Brilho de uma paixão, que mostra os últimos anos de vida de John Keats, um dos maiores poetas inglês. Ontem, quando a cidade adquiria feições românticas, vestida de cinza, vi o filme de Jane Campion (diretora de O Piano), com Abbie Cornish e Ben Whishaw no papel, respectivamente, de Fanny Brawne e Keats.  
Sinopse: "Em 1818, o irmão do jovem poeta John Keats adoece e a vizinha Fanny Brawne oferece seus cuidados. Encantado, John se aproxima da moça com o pretexto de ensiná-la poesia. Os dois pertencem a mundos totalmente distintos, mas isso não impede que se apaixonem. E no momento em que a mãe de Fanny e o melhor amigo de John descobrem o caso, já é tarde demais para tentarem desaconselhá-los. O casal mergulha num romance obsessivo no qual a paixão é tão forte quanto as turbulências".
Numa relação dos dez maiores poetas da humanidade, Will Durant inclui John Keats, deixando de fora Ésquilo, Sófocles, Horácio, Ovídio, Virgílio, Petrarca, Milton, Goethe, Byron, Victor Hugo, Heine, Poe, entre outros.
Em Canto ao Rouxinol, o poeta escreve:
Na penumbra escuto e muitas vezes me enamoro da Morte serena, peço-lhe que me exsolva em sopro no ar quieto. Mais que nunca, hoje, parece-me belo morrer, cessar sem dor à meia-noite enquanto soltas pelo espaço o êxtase do teu canto. E continuarias cantando sem que eu, transfeito em pó, tenha ouvidos para ouvir teu sublime réquiem.
Em 1819, a tuberculose se manifesta agudamente. O poeta trocou a Inglaterra pela Itália em busca de sol, mas a mudança não lhe fez bem. Longe da amada, a ideia da morte passou a ser o único reconforto (escreve seu amigo Severn). Compôs o próprio epitáfio: "Aqui jaz alguém cujo nome está escrito na água". Morre em 23 de fevereiro de 1821, com apenas 25 anos, para a profunda tristeza de Percy Shelley (outro poeta inglês incluído na relação dos 10 maiores por Durant). 

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

NAVEGAÇÃO

A cidade, quando cinza, parece um barco no meio da tarde, um barco que escurece a medida que se aproxima do cais. Não demora, é noite. Os ratos saem dos porões imundos, com a ousadia de quem sabe que seus predadores, os gatos, enfastiados de comida, ou dormem aos pés dos homens, ou correm atrás de fêmeas no cio. Cidade, ratos, gatos, homens... tudo navega por esse mar sempre antes navegado, perdidos dentro da neblina. 

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

CONCEITO DE MEME

No último capítulo do livro O gene egoísta (que li duas vezes de tão bom), Richard Dawkins "cria o conceito de meme. Um meme pode ser compreendido como uma unidade de cultura, um comportamento ou uma ideia que pode ser passada de pessoa pela imitação". (Cito a revista filosofia, nº 51.) 
"Existe uma grande discussão sobre se os memes podem ser passados só por imitação ou se podem ser passados por outras formas de aprendizado social. Mas o importante é que eles são copiados de indivíduo para indivíduo. Ele é o replicador e, deste modo, o meme é o análogo cultural do gene."
Segundo Susan Blackmore, "memes são instruções para realizar comportamentos, armazenado no cérebro (ou em outros objetos) e passado adiante por imitação".
Exemplos de memes: a moda nas roupas e na alimentação, cerimônias e costumes, artes, ideias, o alfabeto, a religião etc.   

terça-feira, 26 de outubro de 2010

MEME DA CORRUPÇÃO

O debate político (não seria embate?), que ocorre entre os dois candidatos à presidência e, de uma forma generalizada, entre os brasileiros mais ou menos politizados, com posição definida, não sai do zero a zero, do dez a dez, enfim, do empate. Por falar em “brasileiro politizado”, o país se divide atualmente entre a defesa da liberdade democrática, a começar pela liberdade de expressão (por um lado), e o arrivismo* fanático, corruptor e violento (por outro). A maioria dos que apoiam os representantes arrivistas, isto é, eleitores pobres, ou pobres leitores, conquanto eleja qualquer um(a) pela quantidade, constitui massa de manobra, indiferente aos aspectos éticos que deixam a desejar, que seriam decisivos em lugares menos corrompidos do planeta. Denúncias de propinas milionárias, de aditivos de contratos milionários, de fraudes milionárias, de novos milionários (que há dez anos ainda combatiam a burguesia, com um discurso que se prova agora, do tipo “uvas verdes”), todas essas denúncias são inúteis em véspera de eleição. Completamente inúteis para provocar uma mudança a favor da lisura do próprio processo eleitoral. No Brasil, a corrupção já se transformou em meme** da nossa cultura. O mensalão, por exemplo, virou piada, rap, samba, não mais considerado o uso do dinheiro público para a estruturação de uma ditadura sui gêneris, alicerçada entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional.
* Arrivismo é o procedimento de pessoa arrivista, que quer vencer na vida (no caso em pauta, na política) a qualquer custo.
** Um meme é para a memória o análogo do gene na genética, a sua unidade mínima de informação que se multiplica de cérebro em cérebro. 

domingo, 24 de outubro de 2010

RIMA PRECIOSA

Os poemas de Jorge de Lima, reunidos no Livro de Sonetos, não trazem título, mas são preciosidades literárias poucas vezes produzidas por outro poeta. Num dos sonetos, em que descreve o sortilégio de cinco crianças em torno de uma esfera armilar, antigo instrumento astronômico, há um caso de rima preciosa:
cedê-la a cinco crianças em disfarce,
e houve uma delas que se pôs a alar-se. 

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

FÊNIX 2


......A escada está ali, à sua frente, num canto ainda não explorado da galeria. A iluminação escassa do refúgio permite a visão dos primeiros degraus e a extremidade de um corrimão.
......Fermino Ávalos sorri da própria sorte. Por que não a encontrou antes? Lamenta pelas horas sofridas à espera de seu salvamento. Prestes a começar a subida, olha para trás, de onde parece ter ouvido vozes estranhas. Não tivesse certeza de se encontrar sozinho, ele as interpretaria como um pedido de socorro. Coisa da minha cabeça, diz para si mesmo.
......Com o corrimão preso à destra, puxa-o contra sua perna, num movimento que torna mais fácil a transposição dos degraus. Um ponto de luz acima, minúsculo como as estrelas mais distantes, orienta seus olhos dilatados pela escuridão. Contra a previsão de que logo cansaria, sente-se mais forte à medida que sobe. A expectativa de chegar ao alto é o combustível de seu corpo debilitado. Sentia-se muito fraco até encontrar a escada.
......Ele não imagina o perigo que se apresentará nos próximos passos. Os degraus se estreitam cada vez mais. O corrimão perde a firmeza, quase solto, não passa de um fio de arame que desliza por entre seus dedos. No lugar de paredes rochosas, o vazio. A umidade com cheiro de terra é substituída pelo ar gelado.
......De repente, dá-se conta da imensa torre em que se encontra, desestabilizada pelo peso de seu corpo. Olha para baixo. A esposa, os filhos e uma multidão o acenam. Não ouve o que dizem. Presume que seja para manter a calma.
......Isso acontecendo com ele, um acrófobo desde sempre. A mãe fora jogada para cima durante seu difícil nascimento. Várias vezes. Nasceu numa queda. Os piores sonhos, pesadelos para ser mais exato, sempre apresentaram um cenário como o desta torre na iminência de ir abaixo.
......Ele  se agarra com todas as forças. Embalde. As estrelas giram num fundo de breu. A frágil estrutura pende sem volta para o chão. No momento de sofrer o impacto, umas mãos vigorosas sacodem seus ombros.
......Fermino, despiertate!
......Gritos de alegria enchem o refúgio. Num canto iluminado, sobre  um elevado de cascalhos, acaba de pousar a Fênix 2.  
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(Microconto baseado no resgate dos mineiros no Chile. O personagem Fermino Ávalos é uma homenagem ao primeiro a ser salvo dentro da cápsula Fênix 2, Florencio Ávalos.) 

COMUNICAÇÃO SOCIAL

Hoje concluí o curso de Capacitação em Comunicação Social, propiciado pela Fundação Trompowsky, modalidade a distância. As EB-aulas tiveram início no dia 6 de setembro, por módulos dispostos semanalmente, ao final dos quais havia uma atividade avaliativa. Dos quatro trabalhos exigidos, valendo nota 5 cada, consegui 17 pontos. Na prova final, valendo 80, errei duas questões. Minha nota do curso: 86,33.  
Os trabalhos pedidos pelo curso foram: fazer um convite (do general ao prefeito); escrever um release para a imprensa sobre a convocação para o serviço militar inicial; elaborar uma nota para o Noticiário do Exército; e analisar um case de comunicação.
Desde junho, trabalho na Seção de Comunicação Social da 1ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, envolvendo-me diariamente com várias atividades. Ontem, pela primeira vez, desempenhei a função de fotógrafo em Nova Esperança do Sul, onde o 9º Batalhão Logístico realizou uma Ação Cívico-Social. O Sgt Marcelo Langone e o Sd Mário tinham outras missões. Nossas matérias vem sendo publicadas com frequência no site do Exército
E-mail para contato:  www.scs1bdacmec@gmail.com 
Fone: 3251-2277

terça-feira, 19 de outubro de 2010

TRAVESSURAS DA MENINA MÁ


Estou lendo esse romance de Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura deste ano. "A história começa nos anos 50, em Lima. No bairro aristocrático de Miraflorres, o jovem Ricardo Somocurcio se apaixona pela estonteante e misteriosa "chilena" Lily. Depois de descobrir que, na verdade, ela é peruana e de origem humilde, ele a perde de vista, mas não consegue esquecê-la. (Já li o primeiro capítulo.) Os dois personagens veem seus caminhos se cruzarem ao longo dos anos, em cidades efervescentes como Londres, Paris, Tóquio e Madri, à medida que esse amor cresce e se transforma - como a menina má, que faz travessuras, troca de nome, aparece sem aviso, mas sempre perturba a vida organizada de Ricardo."
Outro livro de Llosa que me chegou às mãos é Pantaleão e as visitadoras
Meu drama: tempo e olhos para ler.

OUTUBRUAZUL


Mais uma vez, escrevo sobre as manhãs de outubro. Por que são tão azuis? A resposta vai do extremo poético ao referencial. As manhãs de outubro são mais azuis, ou devido a um estado contemplativo de quem as observa, ou à posição intermediária da Terra (tanto em seu eixo de rotação quanto em sua órbita translacional). No aspecto da Física, o planeta ocupa uma posição correspondente seis meses depois, o que faz abril ter manhãs tão azuis quanto às de outubro. A primavera é decisiva, no entanto, como fator de desempate pró-manhãs de outubro. A estação das flores melhor condiciona o observador. Este sai a caminhar entre 7 e 8 horas, quando as ruas, ainda vazias de gente e de automóvel, são viveiros de pássaro. A temperatura agradável (pena que não se mantém assim ao longo do dia). O poeta vê o céu em toda sua azulidade. Inspira profundamente o ar ainda umedecido pela orvalhada. O efeito desse passeio pode ser um pensamento, uma reflexão, um poema. Com a alma inundada pela manhã, o poeta (e pensador) se questiona sobre pessoas que acordam tarde, sobre pessoas não contemplativas, sobre pessoas desconfiadas com os próprios sentidos, sobre pessoas crentes numa outra vida. Nietzsche, que foi filósofo e poeta, associava tais pessoas ao niilismo disfarçado de eternidade. Até falam de amor, mas odeiam a vida, acusando-a por todo sofrimento. Incapazes de compreender a existência como fenômeno estético, como algo que se justifica por si só. Eu vivo, e isto basta. Mas vou além: sou a própria vida que se vê com aprovação. A beleza está em mim, mas ela precisa de um quadro, como o das manhãs azuis, onde possa se refletir. Apenas para saber disso vale a pena ter nascido (parafraseando um verso pessoano). Simplificação exagerada? Penso que não, caríssimo visitante.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

RIMAS RICAS, RARAS E PRECIOSAS

Todo iniciante na poesia generaliza como sendo a rima o que há de mais importante na arte da palavra. Para não contrariá-lo (o que pode ser considerado bullying literário), vamos dar uma analisada nessa que se constitui numa microestrutura rítmica. Entre as várias classificações em que se enquadra a rima, destaca-se a qualidade dos vocábulos. Nesse aspecto, a rima pode ser: pobre, rica, rara ou preciosa. Também aqui os iniciantes são facilmente identificados: seus poemas são rimados pauperrimamente. 
Rima pobre: feita com palavras da mesma classe gramatical (principalmente verbo com verbo, no infinitivo, no gerúndio ou no particípio);
Rima rica: feita com palavras de classes diferentes;
Rima rara: obtidas com palavras para as quais haja poucas rimas possíveis (edifício - orifício, cisne - tisne, profícuo - conspícuo...); 
Rima preciosa: feita com palavras combinadas: múmias - resume-as, vence-a  - sonolência, vê-las - estrelas...). 
No livro Poesias novíssimas & antycqüas, do Oracy Dornelles, há muitos exemplos brilhantes de rimas ricas, raras e preciosas. Outro poeta que trabalha com rimas preciosas é Gilberto Mendonça Telles.

domingo, 17 de outubro de 2010

DOMINGO

Há algum tempo venho observando o seguinte: os blogueiros fazem domingo. Salvo raras exceções, isso pode ser confirmado numa rápida visita aos blogs do nosso universo hipertextual. Excepcionalmente neste domingo, a hora adiantada acabou surpreendendo a todos no adiantado da hora. Blogueiros ou não, levantamos tarde (para maior faturamento do mercado de alimentos prontos). 
Até os jornais de domingo são editados no sábado. Algumas notícias já são velhas, lidas e relidas na Internet. Por isso, vou logo aos editoriais, aos artigos de opinião. 
O Zero Hora, por exemplo, traz boas opções de leitura nesses gêneros. Flávio Tavares produz um texto extraordinário em sua coluna: A lição dos chilenos
"Fico a imaginar o que ocorreria se a operação de resgate dos mineiros chilenos fosse em Brasília, para salvar a cúpula do governo federal soterrada na lama dos subterrâneos do Palácio do Planalto. No Chile, 33 mineiros estiveram presos durante 70 dias a 700 metros de profundidade e, ao decidirem sobre quem seria o primeiro e quem o derradeiro a ser resgatado, o capataz do grupo resolveu: 'Sou o chefe e serei o último!'.
"Em Brasília, se a lama dos porões do planalto aprisionasse 33 figuras da cúpula do governo, há dúvida sobre quem seria o primeiro a salvar-se?
"O capataz e chefe decidiria:'Sou presidente da República e serei o primeiro!'. Içado à superfície, todos correriam a bajulá-lo, vendo no resgate um milagre de Jeová e Alá juntos. Na adulação, se esqueceriam dos demais. E, como lodo não falta por lá (nem na seca de agora), as cavernas soterrariam Erenice Guerra e os seus". 
Aqui suspendo a transcrição da coluna de Tavares para perguntar quanto Erenice Guerra ganhou para suportar sozinha a montanha de lama. Os outros saíram limpos, inclusive sua chefa que tudo sabia. A propósito, os brasileiros não mais percebem na linha do horizonte político a maior montanha no Brasil: o mensalão. O processo eletivo para presidente engambela a todos e faz terraplena da corrupção. 

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

DIA DO PROFESSOR

Tudo o que é dito ou escrito sobre o professor, todo discurso, ou fundamenta-se na realidade, ou não passa de idealização. No primeiro caso, o discurso segue mais ou menos a fórmula "o professor não é o único responsável pela péssima qualidade do ensino atual". Obviamente, aqui entrariam as causas imediatas e mediatas.  No segundo caso, a fórmula do discurso idealista começa com "o professor é aquele que (isto ou aquilo)". 
O Dia do Professor, à semelhança de todos os outros dias dedicados a alguém ou a alguma cousa, constitui-se no único momento em que se permite o ideal, a emotividade. À exceção da educação infantil, o professor é raramente visto como merecedor de homenagens. Certas instituições de ensino, entre as quais a URI, antecipam o feriado para o Dia da Criança, obrigando o professor a dar aulas no dia a ele dedicado. Isso demonstra que o realismo, sob o domínio da razão, começa a interferir nos devaneios sentimentais. 
Futuramente, pela própria razão, o mundo voltará a valorizar o professor. A frase que destaquei acima como exemplo para o primeiro caso, que cedo ou tarde acabará prevalecendo, já é um indício dessa valorização. Nestes tempos, vivemos a transição entre a infância e o adulto. O professor não tem chance com adolescentes, sujeitos de discurso ainda confuso entre o real e a idealização.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O POETA DA RAZÃO

"João Cabral de Melo Neto, um dos grandes poetas contemporâneos de Língua Portuguesa, construiu uma obra marcada por um estilo que beirava a engenharia. 
Em seus últimos anos de vida, João Cabral  vinha sendo insistentemente apontado como forte candidato ao Prêmio Nobel de Literatura, escolha que inauguraria a ainda inédita galeria dos brasileiros laureados com o maior dos reconhecimentos literários. Perguntado por um jornalista se desejaria ganhar o Nobel. Cabral respondeu: 'Quem é que não desejaria?'. Realista, fez questão de acrescentar: 'Mas não creio que haja possibilidade'. O poeta, que construiu toda sua obra privilegiando a razão, estava mais uma vez, coberto dela. Afinal, uma crítica frequente é a de que os critérios adotados para a concessão do Nobel de Literatura, em geral, parecem não valorizar de forma adequada os aspectos estritamente literários, concentrando-se mais nos políticos."
(Publicado na última edição da revista Literatura.)
Vargas Llosa foi premiado este ano por critérios notadamente literários de sua obra, a despeito de sua crítica à esquerda latino-americana.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

VEJA (A CONTRADIÇÃO DE DILMA)

Hoje recebi a revista Veja e percebo seu atraso numa rápida leitura da capa: a contradição não é um motivo que tenha relevância para os brasileiros. Aquele que se contradiz  não mais perde votos. Pelo contrário, no atual estágio de degeneração ética na política, ganha-se votos com a contradição, com a mentira.
Antes de 2002, os petistas citavam a revista frequentemente nas campanhas de seu candidato a presidente. A partir desse ano, passaram a acusar a revista de ser tendenciosa, conservadora etc. Não se reconhecem contraditórios. 
Infelizmente, já vivemos a época predita pelo grande Rui Barbosa.
A Veja perde tempo (e espaço) em evidenciar a contradição de Dilma Rousseff (ou de quem quer que seja).

terça-feira, 12 de outubro de 2010

MINA SAN JOSÉ

(Há algum tempo, deixei de ser o senhor do meu blog, controlador inquestionável das postagens que fazia ao bel-prazer. A relação agora é de subserviência à minha criação. Sou quase exigido a atendê-la diariamente. Ontem não o fiz, o que me força a apressar nesta manhã azul azulíssima de outubro.)

O mundo acompanha o resgate dos mineiros chilenos. O presidente do país, Sebastián Piñera, transforma esse final feliz num motivo para reunificação do Chile, dividido com as últimas eleições. A tragédia, cujo aspecto de maior dramaticidade era o tempo calculado para o salvamento, demasiado longo para que os mineiros sobrevivessem a 700 metros dentro da Terra, acabou não tendo o indesejado ápice da morte. Os familiares desses prisioneiros de Hades mudaram-se para a entrada da mina, onde pudessem acompanhar a difícil operação. O Acampamiento Esperanza transformou-se numa cidade. Os mineiros já pensam em ganhar dinheiro com a história, disputando entre si a ordem de seus resgates. Segundo o depoimento da mulher de um deles, todos querem ser o último para deter o recorde e ganhar maior notoriedade como herói. 
O início do resgate está marcado para as primeiras horas desta quarta-feira. Aguardemos ansiosamente. 

domingo, 10 de outubro de 2010

sábado, 9 de outubro de 2010

LIU XIA(OBO)

O nome da mulher de Liu Xiaobo é Liu Xia. E agora? O que se pode inferir dessa homonímia? Acaso?  Lei dá à mulher o mesmo nome do marido (com redução)? Ao marido, o mesmo nome da mulher (com acréscimo)? Em razão de completo desconhecimento das mais de trinta línguas faladas na China, a homonímia permanecerá um mistério. Um exercício para a imaginação.
Liu Xiaobo é ex-professor de Literatura, e Liu Xia é poetisa.  

PARADOXO DA CHINA



O ganhador do Nobel da Paz de 2010, o chinês Liu Xiaobo, encontra-se preso e não sabe do prêmio. Não imaginamos que algum guarda da prisão ou visitante (no Brasil, não faltariam rábulas, que não mais agem apenas na porta da cadeia) vai contar a Liu. O autor da notícia seria preso também. Liu Xia, mulher de Liu, é a única que está autorizada a contar sobre o Nobel. A visita já era para ter ocorrido, foi adiada para este domingo. O problema das autoridades chinesas consiste em ceder às pressões da opinião pública internacional ou não. A liberdade de Liu, nestas alturas, seria reconhecer os valores da democracia defendidos pelo ex-professor de Literatura, um golpe na ideologia do partido comunista (que mantém a ditadura no país). Manter o dissidente encarcerado, acusar o Prêmio Nobel de obscenidade, romper relações com a Noruega, entre outras medidas dessa natureza, provocará uma onda tsunâmica de críticas contra a política chinesa. De qualquer forma, ganha Liu em notoriedade.  

PÉ QUEBRADO

Nos anos oitenta, encontrava-me frequentemente com o Oracy para mostrar-lhe meus poemas, ouvir suas apreciações e tirar algumas dúvidas. Muitas vezes, ouvi o poeta falar em "pé quebrado", em relação ao verso escandido. Com a facilidade que sempre tive de fazer inferências, relacionava o "pé quebrado" com a quebra do ritmo, ou pela falta de uma sílaba, ou pelo excesso. 
Armindo Trevisan escreve o seguinte: 
"Na poesia clássica, ou seja, greco-latina, a menor unidade de verso era o , formado por duas ou mais sílabas, divididas em dois elementos: a tese e a arse. Para os gregos, a tese indicava o tempo forte, no qual se batia o pé (donde procede o nome); e a arse, o tempo fraco, no qual se erguia o pé. Para os latinos, invertiam-se as denominações.
"Transportados para uma língua neo-latina - como o português - os dois termos indicam as sílabas tônicas e as sílabas átonas. Em termos de versificação isossilábica (ou seja, na qual todas as sílabas tem peso igual), os esquemas clássicos podem ser reduzidos a quatro, dois binários e dois ternários".
O ritmo binário pode ser ascendente (jâmbico): a nuvem guarda o pranto. Começa com uma sílaba átona, seguida de uma tônica (o pé).  E pode ser descendente (trocaico): paira à tona da água. Começa com uma sílaba tônica, seguida de uma átona.
O ritmo ternário pode ser ascendente (anapéstico): tu choraste em presença da morte. Começa com duas átonas, seguidas de uma tônica. E pode ser descendente (dactílico): formas e ideias eu bebo. Começa com uma sílaba tônica, seguida de duas átonas. 
O último verso acima, de Fernando Pessoa, tem um pé em for-mas ei, outro em dei-as eu. 
Obviamente, dentro de um mesmo verso é possível as mais variadas combinações desses acentos ou pés. Você pode fazer as suas livremente. Para isso, não há lei nem regra. 
Por derradeiro, a unidade rítmica é chamada de porque os gregos marcavam o ritmo com o pé, tal como muitos músicos populares de hoje. 

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

NOBEL DA PAZ

O chinês Liu Xiaobo, ex-professor de Literatura, ganhou o Nobel da Paz deste ano. O novo detentor do prêmio é detento na China, por assinar a Carta 08, "petição formulada para exigir reformas políticas no regime comunista". Está preso por querer a liberdade (apenas um ideal em certos países do mundo, como na própria China, na Coreia do Norte, em Cuba...). As autoridades chinesas se irritaram com a distinção. 

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

GARCÍA MÁRQUEZ (A PROPÓSITO)

O escritor colombiano Gabriel García Márquez publicará no final deste mês seu novo livro, Yo no vengo a decir un discurso, compilação de 22 textos escritos para serem lidos em público. Depois de Memorias de mis putas tristes, GM não publicou mais nada. Oxalá esse livro não encerre o ciclo produtivo do autor de Cien años de soledad! A prosa referencial, crítica, marcou o início de sua carreira nos diversos jornais da Colômbia.  

VARGAS LLOSA É NOBEL DE LITERATURA

O escritor peruano Mario Vargas Llosa é o vencedor do Nobel de Literatura de 2010. O prêmio foi anunciado nesta quinta-feira na sede da Academia Sueca, em Estocolmo.
Nascido em 1936, o novelista e ensaista é considerado um dos maiores nomes da literatura em língua espanhola. Entre suas principais obras estão Os chefes, A cidade e os cachorros (Batismo de fogo), A casa verde, Conversa na catedral, Pantaleão e as visitadoras, A guerra do Fim do Mundo, Quem matou Palomino Molero  e Travessura da menina má.
O comitê informou em um comunicado que Vargas Llosa recebeu o prêmio "por sua cartografia de estruturas de poder e suas imagens vigorosas sobre a resistência, revolta e derrota individual".
Ele já foi condecorado com o Prémio Cervantes em 1994 e o Prêmio Príncipe das Astúrias de Letras Espanha em 1986, entre outros prêmios, e é membro da Real Academia Española desde 1994.
O Prêmio Nobel vem acompanhado de um prêmio em dinheiro de US$ 1,6 milhão.
Em 2009, o prêmio foi dado à escritora alemã Herta Müller, 12ª mulher a vencer o Nobel de Literatura.
(Li dois ou três livros de Vargas Llosa, em razão de minha preferência por García Márquez, J. L. Borges, Julio Cortázar, entre outros escritores americanos.)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A TRA(I)ÇÃO

O potencial cômico da postagem abaixo se amplia com a lembrança da traição da Manu: eleita pelos gaúchos a primeira vez, foi namorar com um deputado paulista.
(Os comentários que recebi também contribuem para o risível. Comentários não publicados aqui.)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

VOTO TIRIRICA PARA MANUELA

O paulista ri ao votar no Tiririca. Ou riso debochado, ignóbil, anarquista. Ou riso alienado, ignaro, simplista. O gaúcho ri de quem votou no Tiririca. Riso politicamente correto. O Tiririca ri para quem votou nele. De outra forma, ri de quem ri dos que votaram nele. Portanto, o palhaço ri dos gaúchos. Ri dos mais politizados. Tudo é risível no Brasil, fechando com a grave sentença (cuja autoria não se pode atribuir a De Gaulle) de que não somos um país sério. 
Após essas eleições, proponho uma nova designação para o voto inexplicável, inconsequente, descrito acima pelo riso correspondente: VOTO TIRIRICA.
Em Santiago, tivemos muitos votos que podem ser assim classificados. Começo por perguntar se há uma representação do PC do B na Terra dos Poetas. Pergunto se havia comitê de algum político do PC do B na  Terra dos Poetas. Pergunto se havia cabo eleitoral de algum político do PC do B  na Terra dos Poetas. Mais objetivamente, pergunto se Manuela d'Ávila veio à Terra dos Poetas alguma vez. Pergunto, por derradeiro, o que explica os 845 votos para Manuela d'Ávila na Terra dos Poetas. Mônica Leal, que veio à Terra dos Poetas diversas vezes, com comitê, carreata, cabo eleitoral, partido e muita simpatia, teve apenas 592 votos.
O que explica tantos votos para Manuela d'Ávila se não o fato de ela ser bonitinha (perto das demais candidatas)?  
Minha conclusão é de que o voto dado a Manuela d'Ávila pelos santiaguenses não é muito diferente do voto dado a Tiririca pelos paulistas. O nhenhenhém que tenta justificar que é assim a democracia não justifica, torna, isto sim, risível a própria seriedade. 

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

SLOGAN DA FEIRA DO LIVRO

Livros: janelas e portas que se abrem” é o slogan da 12ª Feira do Livro de Santiago. Uma excelente escolha, a começar pelo aspecto rítmico da frase (equivalente a um verso dactílico). Isso é relevante para a melhor fixação na memória de quem ouve (principalmente). O aspecto semântico é o que mais se destaca, todavia, singularmente poético pela metáfora duplicada, “janelas” e “portas”. Janelas e portas se abrem, pouco importando em que posição se coloca o leitor/ouvinte: dentro ou fora. A ignorância pode ser comparada a uma prisão, a um compartimento fechado, com pouca luz. A leitura, o conhecimento, antes de representar os olhos que veem mais e mais longe, consiste na mão que puxa o trinco das janelas ou gira a chave das portas. Abrindo-se umas e outras, o ar e a claridade entram para o bem de quem, até então, vegetava no interior da casa (óbice para o corpo e para a alma). De fora para dentro, o ato de “abrir portas” figura como novas oportunidades para quem bate, para quem deseja entrar em determinada empresa, em determinado grupo. Objetivamente falando, quem lê consegue entrar sem dificuldade no grupo dos que se expressam melhor, dos que se comunicam melhor. Em Santiago, por exemplo, alguns acabam desenvolvendo o gosto pela poesia. Os versos que produzem (para serem musicados também) não passam de lugares-comuns, já exaustivamente explorados, com a agravante do ritmo instintivo, sem qualquer aprimoramento técnico. Falta leitura para eles, leitura de outros poetas que chegaram até aqui com o beneplácito do tempo (o melhor crítico). Independentemente do sentido, referencial ou figurado, janelas e portas se abrem com os livros. Para estes, abre-se uma porta primeira mais uma vez: a Feira do Livro de Santiago.  

SANTIAGO ENCENA

Os santiaguenses devemos comparecer ao 14º Santiago Encena no Salão Nobre do G.S.S.G.S., de 06 a 09 de outubro de 2010. Festival imperdível.

domingo, 3 de outubro de 2010

O CAVALO NA FRINCHA DO TEMPO

Na última semana, recebi o livro O cavalo na frincha do tempo, de Vilma dos Santos Viana. A autora quer vir a Santiago para lançá-lo no Centro Cultural (ou na12ª Feira do Livro, dependendo de contato). Em dezembro de 2006, lançamos sua primeira obra: O ventre da Maria-Fumaça.
Vilma nasceu em 12 de junho de 1929, no município de Rio Pardo, RS. Antes de se dedicar a escrever, exerceu a profissão do magistério. Em Santa Maria, atuou por longo tempo como supervisora na área de Educação de Adultos do MEC/Fundação Educar. 
O prefácio do livro é assinado por Airton Ortiz, jornalista e escritor. Na primeira parte, Vilma narra sobre o carreiramento nos anos 30, lembranças e reflexões sem freio. Em seguida, um caderno de fotos lindíssimas de cavalos. Na segunda parte, publica um longo poema de exaltação ao cavalo, epigrafado por uma estrofe de Potro sem dono, de Paulo Portela Fagundes. Na terceira parte, a autora transcreve os principais lances com a participação do cavalo nas artes e na história dos povos. Em seguida, "o cavalo na poesia e na melodia", onde aparece um excerto do meu poema Cavaleiro (publicado em Ponteiros de palavra). Como encerramento, um depoimento de Antônio Augusto Fagundes sobre o livro. 
Hoje entrarei em contato com a escritora que reside em Porto Alegre, para saber se ela virá a Santiago para  lançar seu livro na feira.