quinta-feira, 29 de abril de 2010

O TRABALHO DIGNIFICA?

Não li A ética protestante e o espírito do capitalismo, de Max Weber, para entender por que o trabalho dignifica o homem. O sociólogo, ao contrário do que pensava Marx acerca da religião, talvez visse no trabalho realmente uma imposição divina. Teorias à parte, a frase weberiana virou um jargão que extrapolou o sentido original para se constituir numa mentira dessacralizada. No século XIX, quem trabalhava era o senhor de engenho ou seus escravos? Os dois. Estes na execução das tarefas duríssimas do dia-a-dia, e aquele, na administração da fazenda. Este enriquecia, e aqueles morriam trabalhando sem a mínima dignidade. No século XX, o trabalho passou a significar toda e qualquer atividade, inclusive a de se prostituir (com projeto de ganhar status de profissão regulamentada). Baseado em Weber, quanto mais clientes tiver, mais digna é a prostituta? Qual a nobreza que cabe a quem trabalha por um salário pequeno ao longo de sua vida? Se o indivíduo não acredita em Deus, o que poderá salvá-lo do estresse, da depressão, do suicídio? Forjada em tempos trevosos, a doutrina da predestinação não mais responde pela dignificação do trabalho, tampouco o modelo explorador da atualidade, com o chicote substituído pela pecúnia. Basta saber o que acontece dentro das grandes lojas comerciais, das fábricas, das lavouras (no campo). Em Santiago, para não ir longe, há empresas (grandes varejos) que cerram as portas, baixam as cortinas e continuam a exigir de seus funcionários, sem pagar-lhes horas extras. Os donos, capitalistas abastados, encontram-se distantes. Em seus lugares, não necessariamente como imediatos no organograma administrativo, são colocados gerentes cascas-grossas (equivalentes ao capitão-do-mato). O trabalho dignifica, sim, uma minoria de homens livres.

(Texto produzido para a coluna do Expresso Ilustrado desta sexta-feira, véspera do Dia do Trabalho.)

Um comentário:

Al Reiffer disse...

Sou da opinião que o trabalho somente dignifica quando trabalhamos no que é a nossa vocação. Quando trabalhamos não só por motivos racionais, ou por necessidade de sobrevinência, ou com intenções de lucro financeiro, mas também, e principalmente, com o coração, o que nos traz o prazer em trabalhar. De resto...

Ótima postagem.