quinta-feira, 20 de agosto de 2009

NOVA SAZÃO

Esta semana, escrevi a coluna para o Expresso Ilustrado com o maior cuidado. Por dois motivos, fugi à minha característica ao escrever o texto (que transcrevo abaixo): fui otimista e falei mal do inverno. Para que eu mereça aplausos, o tempo precisa melhorar até a manhã desta sexta-feira. Desde segunda-feira, quando elaborei a primeira versão da minha crônica, até o presente momento, espero que o Sol retorne no dia da publicação do jornal. Um céu cinzento amanhã, e minha crônica meio profética perderá muito do brilho.

O inverno deste ano vinha sendo demasiadamente cinza. Por fora e por dentro. No excesso de roupas, nas relações distanciadas pela ameaça do vírus, nos escândalos políticos, nas ruas vazias de nossa cidade. Entra agosto, muito diferente de outros agostos. O reinício das aulas é adiado. O frio dá uma pequena trégua, mas retorna com bastante umidade. A partir desta semana, no entanto, ocorre a transformação: o cinza passa para um segundo plano, logo para um terceiro, até desaparecer no fundo das paisagens. Crianças e adolescentes voltam às aulas, colorindo as ruas com suas mochilas, suas vozes, seus sorrisos. Os colégios constituem polos convergentes, onde a vida se manifesta em sua mais auspiciosa perspectiva. Paralelamente ao fator humano, a natureza desperta do feitiço imposto por Deméter, triste pela ausência da filha querida. Nas calçadas, praças, parques, quintais, campos, bosques e matas, eis que prorrompem as primeiras flores do pessegueiro, do cinamomo, da laranjeira, do ipê... Elas enfeitam a fronte de Perséfone (personificação mítico-poética que anuncia o retorno da mais bela das estações). Os poetas partilham da alegria que os gregos da Antiguidade experimentavam na chegada da primavera. A mutação sazonal, que sempre acontece entre agosto e setembro, faz bem a todas as pessoas, já afetadas por dias encobertos, monocrômicos, varridos por ventos gelados. As flores são acompanhadas pelas brotações verdes, perfumes agradáveis, borboletas esvoaçantes, trigais maduros, manhãs claras... Ante esse quadro de mil cores, o cinza passado não deixa saudade.

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