segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

NÃO TENHO RAZÃO?

Transcrevo o artigo do Juremir Machado da Silva, publicado hoje no Correio do Povo
O CAÇADOR DE MITOS
Continua a fazer barulho na França o livro 'Como foi Inventado o Povo Judeu', do historiador israelense Shlomo Sand, da Universidade de Tel Aviv, que viveu até os 2 anos de idade num campo de concentração e foi soldado na Guerra dos Seis Dias. Nossos desconstrutores de mitos não dão nem para a saída perto desse intelectual sem papas na língua nem medo de arranjar encrenca. Segundo ele, a ideia de que os judeus são um povo, uma etnia ou que descendem de Moisés, Davi e Salomão é apenas uma fábula religiosa recuperada no século XIX e oficializada a partir de 1960. Num artigo para o jornal Le Monde Diplomatique, Sand situou o mito na sua forma tradicional: 'Qualquer israelense sabe que o povo judeu existe desde a entrega da Torá no monte Sinai e se considera seu descendente direto e exclusivo. Todos estão convencidos de que os judeus saíram do Egito e fixaram-se na Terra Prometida, onde edificaram o glorioso reino de Davi e Salomão, posteriormente dividido entre Judeia e Israel. E ninguém ignora o fato de que esse povo conheceu o exílio em duas ocasiões: depois da destruição do Primeiro Templo, no século 6 a.C., e após o fim do Segundo Templo, em 70 d.C.'. Um mito bem estruturado.Sand o desmontou: 'De onde vem essa interpretação da história judaica, amplamente difundida e resumida acima? Trata-se de uma obra do século XIX, feita por talentosos reconstrutores do passado, cuja imaginação fértil inventou, sobre a base de pedaços da memória religiosa judaico-cristã, um encadeamento genealógico contínuo para o povo judeu. Claro, a abundante historiografia do judaísmo comporta abordagens plurais, mas as concepções essenciais elaboradas nesse período nunca foram questionadas'. Nunca tinham sido questionadas. Ele tratou de fazer isso: 'Mas eis que, ao longo dos anos 1980, a terra treme, abalando os mitos fundadores. Novas descobertas arqueológicas contradizem a possibilidade de um grande êxodo no século XIII antes da nossa era. Da mesma forma, Moisés não poderia ter feito os hebreus saírem do Egito, nem tê-los conduzido à ‘terra prometida’ – pelo simples fato de que, naquela época, a região estava nas mãos dos próprios egípcios! (...) Tampouco há sinal ou lembrança do suntuoso reinado de Davi e Salomão. As descobertas da década passada mostram a existência de dois pequenos reinos: Israel, o mais potente; e a Judeia, cujos habitantes não sofreram exílio no século 6 a.C. Apenas as elites políticas e intelectuais tiveram de se instalar na Babilônia, e foi desse encontro decisivo com os cultos persas que nasceu o monoteísmo judaico'. O livro de Sand sacudiu Israel e dá o que falar na França.Sobra pouco do mito: 'E o exílio do ano 70 d.C. teria efetivamente acontecido? (...) Os romanos nunca exilaram povo nenhum em toda a porção oriental do Mediterrâneo. Com exceção dos prisioneiros reduzidos à escravidão, os habitantes da Judeia continuaram a viver em suas terras mesmo após a destruição do Segundo Templo'. Isso não deslegitima Israel nem autoriza pretensões racistas. Prova que a história é construção: 'Esses relatos (...) figuraram na historiografia sionista até o início dos anos 1960'. Para o judeu iconoclasta Shlomo Sand, os judeus são apenas os membros da religião ou da cultura judaica que se formaram principalmente por conversão na África do Norte, no Sul da Europa e no Iêmen. Ironia? A história, porém, sempre reaparece para gerar polêmica.
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Desde agosto de 2006, quando li A Bíblia não tinha razão, de Israel Finkelstein e Neil Asher Silberman, venho escrevendo sobre o assunto do livro acima considerado pelo colunista do CP. Neste blog deve ter duas ou três postagens referentes às mitificações judaico-cristãs. Arqueologicamente, não há indícios do êxodo conduzido por Moisés. Da mesma forma, Judá e Israel eram "estados" relativamente pobres (Salomão não tinha a riqueza apregoada pelos cristãos). Citar a inexistência do dilúvio, mais antigo, é prevalecimento discursivo, uma vez que se trata de uma narrativa suméria, do Livro de Gilgamesh. Frei Leonardo Boff, em seu livro A águia e a galinha, escreve sobre um gênero textual muito cultivado pelos judeus, o midraxe-hagadá, que consiste em aumentar uma história ou de adequá-la (à saga de seu povo). Por falar em livro, vou atrás desse 'Como foi Inventado o Povo Judeu', do judeu Shlomo Sand. Juremir é o cara (apesar de discordar dele sobre o caso Cesare Battisti). Há alguns anos, por indicação sua, li A extensão do domínio da luta, de Michel Houellebecq.

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