domingo, 20 de julho de 2008

UMA NOVA ESCRITORA


Algumas promessas literárias já despontam no horizonte de eventos que justifica o epíteto Terra dos Poetas para a nossa Santiago. Entre os novíssimos escritores, Erilaine Perez é um nome que merece nossa atenção. Seus primeiros textos (publicados no Letras Santiaguenses e no projeto Santiago do Boqueirão, seus poetas quem são?) permitem essa apreciação favorável. Ultimamente, vem editando em seu blog www.erilainepoeta.blogspot.com. A crônica da Erilaine é de uma profundidade e de um estilo que desperta o encantamento poético. Abaixo, transcrevo dois exemplos que iluminam:
oooo
ILUSÃO
Seus olhos estavam distantes demais para que visse com clareza. A última imagem que o espelho refletiu, mostrava duas luas escorrendo-lhe olhos abaixo, rio adentro. Esse curso talvez fosse o único que de fato não poderia perseguir, nem que desejasse, era o caminho do meio. A percepção, já totalmente distorcida pelos eventos passados, confere-lhe ainda hoje uma aura de tristeza. Um silêncio de estrelas vive a queimar seus ossos. Anda distraída por aí, entre luzes e sombras do que um dia fora, vivendo de mimetismos como uma camaleoa. Ela mesma não tem mais certeza quanto à veracidade do que vivencia. Mas ainda pode lembrar dos ataques que sofrera por ter ousado falar o que entendia... Verdades não existem... A resposta havia chegado voando sobre a ilusão óptica das cores, no fenômeno da fundamental ausente, nas sensações táteis contrastantes. Ela há muito descobrira que o tempo nem mesmo é. Alimentava-se dos segundos, minuto a minuto, e regurgitava um limo ainda fértil desde mil anos. Observava as pessoas. Pensava... São como aranhas, tecendo teias que vão garantir o equilíbrio entre o real e o imaginário. Fingem o tempo todo que não são moscas o que comem no jantar. E essa é a grande verdade em que se debruçam com enfunado orgulho. Aliás, a história da humanidade não foi construída guerra a guerra, forjada em orgulhos? Elementar... Preferiu o exílio ensimesmado, e hoje eu posso entendê-la. Ela é diferente de todos os seres que já conheci, inclusive os da escala irracional. É a própria definição da ilusão, como a sua verdade mostra que tem que ser.
oo
ANTES DAS FLORES
Mergulhar na profundidade do sonho e emergir para a realidade. Era esse o seu propósito desde o princípio. De que adianta ser poeta, dono de asas, mas covarde para voar?
Partira para o arroubamento bem antes da estação das flores, quando as folhas ainda não haviam brotado e os galhos das árvores estavam secos.
Contemplativo, meditou sobre a ausência de cores no caminho e concluiu ser milagre a época da floração. Afinal, onde fica encubado o verde até que o sol nasça na primavera?
Pensou que talvez estivesse guardado na memória de quem atravessa o inverno a sua espera. Aquietou-se.
Seguiu caminhando no cinza turvo das dezoito horas, bagagem pequena nas costas. Não importava naquele caminho o que vestir ou parecer, mas as impressões que a estrada vazia desperta em quem busca sentidos que vivem no nada.
E foi do nada que nasce como limo no meio das pedras que ele encontrou os versos de um poema. Do nada que viu entre o bico do pássaro e a penugem do ninho que pôde visualizar o instinto.
No meio do caminho, a primavera chegou. E no intervalo absoluto de tempo entre botão e rosa, ele entendeu o rumo até o fim.
Muitos nadas acontecem todo dia na algaravia. Foi preciso o distanciamento das vozes para a liberação do gênio.
A multidão dos teres e haveres que confundia sua mente, logo ficou para trás. Ele ficou imerso até as asas nesse imenso mar. Encerrado no corpo, um estado entre o oxigênio e a liquidez. Senda ou sina, não sei. Apenas o entendo como ninguém mais poderia. Entendo-o, porque também sou poeta.

oo

Um comentário:

Rúbida Rosa disse...

Quando em minha alma ainda fazia inverno, tu chegastes quente e úmido...
Hoje és o melhor motivo para minha espera de todos os dias. Também é por ti que escrevo.
T.A