sábado, 24 de maio de 2008

O PRAZER DA ESCRITA


O escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo e filósofo francês Roland Barthes defendia que a escrita gera uma espécie de clímax, um têxtase. Todas as semanas, esta coluna me faz experimentar um prazer indescritível. Desde minha estréia em 12 de dezembro de 2003. Quase um lustro. Os fins de semana ganharam o aprazível compromisso de escrever para o Expresso Ilustrado. Todo meu ser de cognição fica atento – qual um pescador à beira do rio. Os assuntos são inumeráveis. O prazer começa com a expectativa de fisgar um peixe grande. A mídia, com a pesca industrial, reduz a escolha para um colunista simples, do interior. Por isso, acompanho seu navio algumas vezes. Independentemente de outras atividades, tenho vivido sábados azuis e domingos dourados com a linha do meu pensamento distendida, a vibrar entre os dedos. A espera é recompensada com a prazerosa definição do tema. Na segunda-feira, o pescador cede lugar ao cozinheiro. Agora é preciso preparar o prato. A forma vai da macro à microestrutura. Assado, frito ou cozido? Tempero? Salada? Vinho? O gênero coluna de jornal, à exceção do espaço previamente determinado, possui mil e uma maneiras de se constituir textualmente. A começar pelas palavras: imagens e sons incontáveis. A arte de escrever consiste em escolhê-las com inteligência, em associá-las com beleza. O estilo nasce da relação hedonista e apaixonada que o escritor mantém com as palavras (como significantes e significados). Evolui nas construções sintáticas (oração e período). Consagra-se no texto, ao qual lhe dá aparência e gosto. Minucioso e exigente na cozinha, não poderia ser de outra forma na escrita. Experimento e reescrevo até quarta-feira, quando entrego o texto na redação. Com a prova tirada na quinta, uma última revisão. Na sexta, o prato vai à mesa, quando o prazer é compartilhado.

(Coluna do Expresso Ilustrado, edição de 23 de maio de 2008)

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